Ex-secretário executivo da Polícia Militar, o coronel Alvaro Batista Camilo é o novo subprefeito da Sé, onde fica a Cracolândia
atualizado 06/02/2023 17:10
São Paulo – À frente de um orçamento de R$ 113,5 milhões
para 2023, o novo subprefeito da Sé, o coronel Alvaro Batista Camilo (PSD), tem
a missão de cuidar do centro da capital paulista – região que engloba pontos
famosos de São Paulo, como a Avenida Paulista, o Mercadão e a Cracolândia.
Em entrevista ao Metrópoles, o novo gestor do centro de São Paulo fala de limpeza e zeladoria, afirma que as equipes de fiscalização vão voltar a recolher barracas de moradores de rua e aborda a questão da Cracolândia.
“A ideia é trabalhar com inteligência para evitar que chegue ao ponto de ocupar o território. Vai chegar o momento que vai precisar usar munição química? Vai”, diz Camilo.
Nome forte na Segurança Pública (SSP) durante o governo João
Doria e Rodrigo Garcia (PSDB), Camilo já foi vereador, deputado estadual,
comandante-geral da Polícia Militar e deixou o cargo de secretário executivo da
PM em dezembro de 2022, com o início do governo Tarcísio de Freitas
(Republicanos).
Ele assumiu a Subprefeitura da Sé na última quarta-feira
(1º/2), a convite do prefeito Ricardo Nunes (MDB), com quem trabalhou na Câmara
Municipal de São Paulo. Entra no lugar do coronel Marcelo Vieira Salles, de quem
foi chefe na SSP, agora empossado vereador.
“Todos os lugares que as pessoas gostam de frequentar estão aqui”, diz Camilo. “Meu compromisso é deixar o centro melhor do que peguei.”
Leia abaixo a entrevista concedida por Coronel Camilo ao Metrópoles:
O senhor é morador do centro de São Paulo?
Moro na zona norte, mas sempre trabalhei aqui. Comecei a trabalhar aos 14 anos, em uma gráfica na Rua dos Andradas, e me apaixonei pelo centro. Quando saí da Academia (de Polícia Militar), lá na década de 1980, escolhi trabalhar no centro. Quando fui promovido a coronel, escolhi trabalhar no centro. Venho passear com a minha esposa, vou a restaurantes na Liberdade, frequento mesmo.
O senhor assume o lugar do coronel Marcelo Viera Salles, que agora é vereador de São Paulo. Vocês já trabalharam juntos na Secretaria da Segurança Pública. Chegaram a conversar sobre a transição?
O coronel Salles fez um excelente trabalho e vou dar continuidade à gestão. Ele assumiu a Subprefeitura da Sé em um momento difícil, quando tivemos uma explosão de moradores de rua por causa da pandemia. Muitas pessoas de outras regiões vieram se instalar no centro. Mesmo assim, ele conseguiu dar andamento a uma série de programas e revitalizou mais de 40 praças. Isso é muito difícil. Se não tiver condição de tomar conta, você arruma uma praça e daqui a pouco está degradada de novo. Por isso, também precisa de um trabalho de conscientização da população. Aliás, vamos fazer campanhas para aumentar o sentimento de pertencimento das pessoas. O centro é de todos nós. Não dá para colocar um agente em cada praça, em cada chafariz e em cada ponto viciado de descarte de lixo. Não há braço suficiente.
Quais são as metas da sua gestão?
Uma das metas é fazer uma Subprefeitura aberta, ouvir, principalmente, a comunidade e os conselhos participativos e de segurança, e trabalhar fortemente contra a desordem. Isso eu sempre fiz. Criei a operação delegada (trabalho de policiais voluntários, na hora extra, com foco na fiscalização de ambulantes), fui defensor do programa Vizinhança Solidária, criei a Lei dos Pancadões.
Quais ações estão previstas para a população de rua no centro?
Eu participo de grupo da Secretaria de Governo que está estudando, especificamente, a população de rua. Um exemplo das ações é o programa Reencontro. Há a construção de locais para trazer essas pessoas por um tempo, unir a família de novo e dar um destino. Muitos que estão aqui não são drogadictos, são moradores de rua, e estão precisando só de uma mão.
Qual é o papel da subprefeitura nisso?
A Subprefeitura vai trabalhar sempre na limpeza, manutenção e zeladoria. A ideia é atuar junto com as secretarias de Direitos Humanos, Cultura, Saúde, Assistência Social, para oferecer soluções. Estou mapeando lugares em que pretendemos agir mais rapidamente. Não podemos ter pessoas morando com meio corpo para a rua, como acontece na Passagem Tom Jobim ou no Túnel do Anhangabaú. Vamos fazer tudo com cuidado e foco sempre nas pessoas, mas precisamos agir.
O que vai ser feito?
Convidá-los a ir para outro lugar. Oferecer acolhimento, um albergue, mas ali não pode ficar. São casos de pessoas que ficam na calçada, com as pernas na rua, no leito carroçável, com risco de serem atropeladas.
Mas muitas pessoas em situação de rua se negam a ir para um albergue.
Não tem só albergue, pode ser abrigo temporário, aluguel social. A ideia é oferecer um leque de possibilidades até o ponto de falar: “Olha, vá para outro lugar porque aqui, infelizmente, você corre risco de morte e não vai ficar”.
Em anos anteriores, equipes de subprefeituras recolhiam barracas e colchões de moradores de rua. Vocês estudam voltar a fazer isso?
Sim, existe um regramento pelo qual não se pode ter a barraca montada durante o dia. Por causa da pandemia, isso não pode ser cumprido hoje. A ideia é fazer com que, gradativamente, a regulamentação seja respeitada.
E recolher objetos de moradores de rua?
Na pandemia, não dava para simplesmente tirar porque tinha muita família com criança. Sem agressividade, a área social, que é preparada para fazer a abordagem, vai começar a oferecer um leque de opções para que a pessoa aceite uma delas. A resposta pode ser: “Ah, quero ficar aqui”. Nesse caso, vai ficar sem barraca.
O prefeito Ricardo Nunes e o governador Tarcísio de Freitas apresentaram um plano conjunto para atuar na Cracolândia, área administrada pelo senhor. O que o plano tem, de fato, de diferente em relação às gestões anteriores?
O maior ganho é o trabalho integrado entre o Estado e o município.
Mas já não era integrado quando o governador era João Doria e o prefeito era Bruno Covas, ambos no PSDB?
Era integrado mas, vou dizer para você, a Prefeitura estava mais à frente. Eu participava de reuniões (como secretário executivo da PM na gestão Doria). Hoje, o Estado realmente colocou sua força junto, tanto é que nomeou o vice-governador (Felicio Ramuth) como coordenador do projeto e disse: “Vamos resolver”. É necessária a ação do Estado porque tem tráfico e tem consumo de droga na Cracolândia.
Como o senhor vê o cenário atual da Cracolândia?
Hoje, nós temos mais ou menos oito pontos de concentração no centro de São Paulo, que variam de 20, 30 pessoas, dependendo do horário, a 100, 200 pessoas. No total, deve dar umas 600 pessoas. Já foram 5 mil, então está mais controlado. A ideia é pensar no contexto como um todo. Essas pessoas precisam ser resgatadas, a maioria não tem mais nem condição de entender o que é certo e o que é errado, mas também é necessário pensar nos moradores e comerciantes. Muitas vezes, os drogadictos não são agressivos, mas só a presença deles – andando de um lado para o outro, procurando droga – assusta as pessoas e a percepção de segurança vai abaixo. A ideia é trabalhar com inteligência para evitar que chegue ao ponto de ocupar o território. Vai chegar o momento em que vai precisar usar munição química? Vai. Muitas vezes manipulados pelo tráfico, eles (usuários) acabam enfrentando o poder público e aí você não tem outra escolha. Não é da minha alçada na Subprefeitura. Minha sugestão é que isso ocorra em último caso.
Vou aproveitar a experiência do senhor na Segurança Pública. Como a droga chega à Cracolândia?
Principalmente pelo grande tráfico. A Cracolândia é um fato, mas existe vontade política do governo do Estado e do prefeito Ricardo Nunes para enfrentar o problema. Já foram feitas reuniões conjuntas com o Ministério Público, a Defensoria, o Judiciário. Não vai conseguir resolver 100%, mas vai mitigar o problema, para que pelo menos a população possa usar o espaço público.
O prefeito Ricardo Nunes já defendeu internação compulsória para casos de usuários há mais de cinco anos na Cracolândia. O governador Tarcísio disse que seria “a última opção”. Qual a visão do senhor?
Temos três tipos de internação: voluntária, involuntária e compulsória, que é por pedido judicial. No Programa Redenção, só há duas internações involuntárias, a pedido da família, nem foi do poder público. A internação compulsória é a mais difícil. Muitas vezes, é feito o pedido, mas a pessoa nem está mais lá no local. Só o fato de, hoje, as concentrações acontecerem em grupos menores já é um grande êxito. É mais fácil combater grupos pequenos, porque a área social e a saúde conseguem chegar. Quando tem mil pessoas, não consegue.
No Brasil, a Justiça não toma decisão sem ser provocada. Quem vai pedir internação compulsória?
(O pedido) tem que sair da área que está fazendo a abordagem, normalmente a área social, seja do município ou do Estado, quando chegar à conclusão de que a pessoa está tão debilitada, que não tem mais condição de ficar ali. O foco é o resgate das pessoas.
Ao fim da gestão, qual é o cenário que o senhor diria “deu certo”?
Que não tenha grandes concentrações que impeçam o comércio de abrir, as pessoas de andar e o filho de ir para escola. A droga existe no mundo todo, infelizmente. O que não pode é ter a droga impedindo o direito de outras pessoas.
O senhor era secretário executivo da Segurança Pública até dezembro de 2022. Dados de delegacias mostram que os assaltos subiram muito em bairros do centro, que agora o senhor administra, como Consolação (89%), Campos Elísios (70%) e Sé (64%). O que aconteceu?
A maioria dos crimes é de oportunidade. A Avenida Paulista, a José Paulino, a 25 de Março são locais com movimento muito grande de pessoas, com mais oportunidade para furtos. Essa movimentação que houve no centro – de desordem, barraca, pessoas nas ruas, camelôs irregulares – também levou ao aumento da criminalidade. É multifatorial, não dá para culpar uma coisa só. Tem a questão da pandemia, da economia, do cara que perdeu o emprego.
Nas últimas semanas, houve ao menos três arrastões em bares em Santa Cecília.
A Subprefeitura cuida da zeladoria. Essas questões têm de ter a participação da Segurança Pública, em si, para evitar que aconteça e identificar e chegar aos autores. No que a gente pode ajudar, ajuda. Em caso de roubo a restaurante, temos pouco a fazer, a não ser cuidar para que (os criminosos) não possam se homiziar e fazer o assalto.
Quais medidas podem ser tomadas para evitar novos assaltos?
Não existe solução mágica, não dá para derrubar o indicador drasticamente de uma hora para outra. Na Subprefeitura, a nossa missão é tornar o ambiente sadio, atuar na chamada prevenção primária, que é a forma que eu tenho de ajudar a segurança. Trabalhar na retirada das barracas, sempre respeitando as pessoas, na zeladoria, não deixar mato alto, locais sem iluminação, com muro quebrado. Tudo isso é atrativo para o criminoso praticar o crime.
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