Segundo o presidente da Comissão Municipal da Verdade de São Paulo, há indícios incontestáveis de que o motorista do carro do ex-presidente fora atingido por um projétil antes de colidir contra um caminhão
10.12.13 - 16h00 - Atualizado em 21.01.16 - 12h47
A Comissão Municipal da Verdade de São Paulo, comandada por vereadores da cidade, apresentou nesta terça-feira (10) o relatório de 90 itens que levaram o grupo a declarar que o ex-presidente Juscelino Kubitschek fora alvo de complô do governo militar para assassiná-lo.
O documento registra várias supostas provas de que o acidente que envolveu Juscelino Kubitschek e o motorista dele, Geraldo Ribeiro, em 22 de agosto de 1976, fora armado por agentes do antigo regime
"Há indícios incontestáveis de que o motorista do carro do ex-presidente fora atingido por um projétil antes do carro colidir contra um caminhão que vinha do lado contrário da Dutra. Toda aquela história de que o Opala onde estava Juscelino e o motorista dele fora atingido por um ônibus da viação Cometa é armação. Laudos, depoimentos e documentos daquela época nos ajudam a concluir que houve fraude e omissão das perícias que atuaram no caso”, afirma o presidente da comissão, vereador Gilberto Natalini (PV).
Na versão oficial contada pela Polícia na época do acidente, o motorista de Juscelino Kubitschek conduzia o veículo Opala pela rodovia Presidente Dutra quando, ao tentar ultrapassar o ônibus Cometa, o carro fora atingido pelo coletivo. O veículo de JK teria perdido o controle na altura da cidade de Resende (RJ), ultrapassando as pistas e colidindo contra um caminhão que vinha em sentido contrário.
Na visão da comissão paulistana, porém, Geraldo Ribeiro teria sido atingido por um projétil antes de perder o controle e causar o acidente. A afirmação se baseia na falta de laudos e exames de raio X feitos no corpo do motorista naquela época e no depoimento de um dos peritos que estiveram no local do acidente naquela noite.
No depoimento do dia 13 de novembro de 2013 à Comissão Municipal, o perito criminal Alberto Carlos de Minas relatou ter sido impedido pelas forças policiais que faziam a proteção do local do acidente de fotografar o corpo de Ribeiro, ao constatar um buraco no crânio do motorista.
Experiente no assunto, o perito disse à comissão que o buraco tinha todas as características de uma abertura causada por arma de fogo. Alberto Carlos de Minas também relatou que, dias depois, recebera a informação de que o crânio do motorista havia sido esfacelado durante o acidente e que, portanto, não haveria como constatar qualquer abertura de projétil. “Parece história da carochinha. Como é que todos os exames foram feitos no corpo do ex-presidente, mas não do motorista que guiava o carro?”, questiona Natalini.
Na época do acidente, a pericia também constatou supostas marcas de tinta do Opala onde Juscelino Kubitschek era conduzido e também no ônibus que era dirigido por Josias Nunes de Oliveira.
O relatório da comissão da verdade diz, entretanto, que laudos da própria perícia técnica da época apontaram que vários ônibus da mesma viação tinham marcas semelhantes, produzidas por manObras inadequadas nas garagens e estações rodoviárias por onde circulavam.
"Ao ouvir o depoimento do motorista Josias Nunes de Oliveira e de passageiros que estavam no ônibus naquela noite, nenhum deles diz ter ouvido barulho de colisão ou sobressaltos antes do fatídico acidente", aponta o documento da Câmara.
Em relato emocionado, o próprio Josias Nunes de Oliveira disse à comissão que havia sido procurado por dois homens travestidos de repórter de um jornal, que ofereceram uma mala de dinheiro para que ele assumisse a culpa por aquele acidente. “Eles foram na minha casa e disseram que se eu não aceitasse o dinheiro e assumisse a culpa, eles bateriam em mim”, declarou Oliveira, hoje com 69 anos de idade.
“Os indícios são bastante contundentes e nos permitem concluir que houve falhas propositais para mascarar os fatos. Apresentamos esse relatório como uma chance de reparação e Justiça histórica ao Brasil e aos brasileiros”, comenta o vereador Ricardo Young (PPS), membro da Comissão da Verdade Municipal. "O governo militar queria imperdir a retomada ao poder de lideranças democráticas legítimas. É lamentável que só agora, 23 anos depois da abertura política e 37 anos depois do acidente, a verdade possa emergir do oceano de armações do regime", completa.
Armação internacional
O plano para matar Juscelino Kubitschek fazia parte de uma conspiraçãointernacional, através da famosa Operação Condor, denunciada pelo jornalista Jack Anderson no jornal norte-americano “The Washington Post” de 02 de agosto de 1979, de acordo com as conclusões dos vereadores de São Paulo.
Baseado em uma carta entre o coronel chileno Manuel Contreras Sepulveda, diretor do serviço de informações especiais da ditadura do Chile, o DINA, publicada pelo próprio “The Washington Post”, o documento paulistano aponta ligações entre a morte de Kubitschek e de Orlando Letelier, na época ex-ministro das Relações Exteriores daquele País.
Letelier fora morto num atentado a bomba em Washington, capital dos EUA, em 21 de setembro de 1976, menos de um mês depois da morte de JK.
Na carta de Sepulveda para o chefe do Serviço Nacional de Informações do Brasil, o SNI, que na época era o general João Baptista Figueiredo, o chileno relato informações secretas de que Kubitschek e Letelier teriam recebido apoio dos americanos do Partido Republicano para retomarem o poder civil em seus países. "O plano proposto por você para coordenar nossa ação contra certas autoridades eclesiásticas e conhecidos políticos social democratas e democratas cristãos da América Latina e Europa conta com o nosso decidido apoio", diz a carta para Figueiredo.
Coincidência ou não, o general Manoel Contreras Sepulveda foi condenado e preso no Chile pelo assassinado de Letelier. Ele foi apontado como o mandante do atentado pela Justiça chilena.
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