domingo, 10 de maio de 2020

Grupo de mais de 500 artistas divulga manifesto em repúdio a declarações de Regina Duarte

Artistas, intelectuais e produtores culturais afirmam que não aceitam 'os ataques reiterados à arte, à ciência e à imprensa, e que não admitem a destruição do setor cultural ou qualquer ameaça à liberdade de expressão'. 'Ela não nos representa', diz grupo ao encerrar o manifesto.

Por Arthur Guimarães, TV Globo

 
 Regina Duarte defende a ditadura! Asqueroso! Regina Duarte ridiculariza mortes e torturas da ditadura militar. Está no lugar certo: ela e Bolsonaro se merecem.

Um grupo de mais de quinhentos artistas, intelectuais e produtores culturais divulgou um manifesto de repúdio às palavras e atitudes de Regina Duarte, secretária nacional de Cultura do governo Jair Bolsonaro.

 

O manifesto foi endossado por atores, cantores, compositores, escritores, roteiristas, cineastas, artistas plásticos, fotógrafos e dançarinos.


Veja lista dos signatários


Regina Duarte, secretária especial da Cultura do Ministério da Cidadania. — Foto: Isac Nóbrega/PR

Regina Duarte, secretária especial da Cultura do Ministério da Cidadania. — Foto: Isac Nóbrega/PR


Eles declaram que fazem parte da maioria de cidadãs e cidadãos que defende a democracia e apoia a independência das instituições para fazer valer a Constituição de 1988.


O grupo pede respeito aos mortos e àqueles que "lutam pela própria sobrevivência no país devastado pela pandemia e pela nefasta ineficiência do poder público" e diz que "não tolera os crimes cometidos por qualquer governo, que repudia a corrupção e a tortura e que não deseja a volta da ditadura militar".

No manifesto, o grupo também afirma que não aceita "os ataques reiterados à arte, à ciência e à imprensa, e que não admite a destruição do setor cultural ou qualquer ameaça à liberdade de expressão".

O manifesto termina dizendo: "Ela não nos representa."



Leia a íntegra do manifesto:

"Brasil, 08 de maio de 2020
Somos artistas brasileiros e fazemos parte da maioria de cidadãs e cidadãos que defende a democracia e apoia a independência das instituições para fazer valer a Constituição de 1988.
Fazemos parte da maioria que entende a gravidade do momento que estamos vivendo e pedimos respeito aos mortos e àqueles que lutam pela própria sobrevivência no país devastado pela pandemia e pela nefasta ineficiência do poder público.
Fazemos parte da maioria de brasileiros que não tolera os crimes cometidos por qualquer governo, que repudia a corrupção e a tortura e que não deseja a volta da ditadura militar.
Fazemos parte da maioria que não aceita os ataques reiterados à arte, à ciência e à imprensa, e que não admite a destruição do setor cultural ou qualquer ameaça à liberdade de expressão.
Como artistas, intelectuais e produtores culturais, formamos a maioria que repudia as palavras e as atitudes de Regina Duarte como Secretária de Cultura.
Ela não nos representa."
Grupo de mais de 500 artistas divulga manifesto em repúdio a declarações de Regina Duarte | Pop & Arte | G1

                                                                        




Pérolas da Netflix - Ele Está de Volta (Er Ist Wieder Da)

De: David Wnendt. Com Oliver Masucci, Fabian Busch, Katja Riemann e Christoph Maria Herbst. Comédia / Drama, Alemanha, 2015, 116 minutos.

É simplesmente impossível assistir a um filme como Ele Está de Volta (Er Ist Wieder Da) e não pensar na nossa situação. Não faz muitos anos que um político lunático aparecia em programas de TV como o CQC e o Super Pop destilando ódio, atacando minorias, sendo preconceituoso, xenófobo, intolerante. O que, inicialmente, parecia uma piada de mau gosto - quem se comportaria, afinal, de forma tão reacionária, tão fascista? -, com o tempo foi ecoando entre a população. Começou a tirar do armário aquele parente fascistoide que estava louco para fazer as suas piadas racistas em paz, sem se preocupar com o politicamente correto, que tornava o mundo um lugar "chato", cheio de pessoas que não achavam mais graça nisso. A forma encontrada para legitimar o absurdo? Alçar ao cargo máximo do País aquela mesma figura pateticamente boçal que dizia na TV que preferia ver o filho morto a namorando um "bigodudo" ou que garantia não ter criado os mesmos filhos em ambiente promíscuo como o que a Preta Gil (!) frequentava. Sim, o tiozão do pavê que "brinca" sobre quilombolas e arrobas, que elogia a Ditadura Militar e que pretende fuzilar adversários políticos é a prova viva de que a cadela do fascismo está realmente sempre no cio - parafraseando Bertold Brecht.

Bom, o que Ele Está de Volta (Er Ist Wieder Da), esse imperdível filme alemão - que já deveria ter sido resenhado aqui - faz é metaforizar em cima dessa ideia, ao imaginar como seria se Adolf Hitler em pessoa se materializasse na terra, mais precisamente na própria Alemanha, nos dias de hoje. Bom, é isso que acontece quando o führer acorda em um bairro alemão e percebe que não está mais num contexto de guerra - ela já se extinguiu faz 70 anos, como mostram os jornais atuais. Embasbacado com as mudanças, com a tecnologia, com a presença do povo nas ruas, Hitler (o ótimo Oliver Masucci) fará amizade com um dono de banca de jornal e, mais tarde, com um jovem jornalista fracassado, de nome Fabian (Fabian Busch), que enxerga na figura excêntrica do general nazista reencarnado, uma oportunidade de retorno ao canal de TV em que trabalhava. A sacada genial da película? Tratar tudo com um senso de humor à moda Sacha Baron Cohen, adotando um estilo documental que aproxima a obra de um realismo quase constrangedor.


Com o objetivo de fazer uma espécie de esquete humorística, Fabian levará Hitler - que ele acredita ser um comediante, um tipo de Andy Kaufman que não sai nunca do papel - a cenários prosaicos, nas montanhas, na praia ou conversando com as pessoas. Mas será em um canal de TV que ele começará, de fato, a ser respaldado: com um discurso sobre a importância do patriotismo, da religião, da garantia das liberdades individuais ele começará a ganhar adeptos pela Alemanha. Viralizará quando youtubers lhe descobrirem. E encontrará eco nas ruas, quando pessoas comuns começarem a reclamar dos imigrantes que lhes tomam seus empregos e da importância da manutenção da raça branca. Com um tipo de carisma meio "torto", Hitler começará a recrutar jovens em comunidades de inceis misóginos, todos eles brancos, héteros e frustrados, com sérios problemas psicológicos e de dificuldade de relacionamento, que integram um sem fim de comunidades neonazistas que flertam com ideais nacionalistas de extrema direita e que pregam o ódio, o preconceito e a intolerância contra o diferente. Sabe o Bolsonaro dizendo que bateria em dois homens se os visse beijando na rua? Pois é, o filme mostra, de alguma forma, que o nazismo está enterrado em uma superfície bem curta, com uma parte dos alemães sonhando efetivamente com o retorno daqueles dias. Dias de uma Alemanha forte, respeitada. Sem judeus, imigrantes, pretos e outras minorias, claro.

Devo admitir que não ter assistido a esse filme logo que foi lançado me fez bem - a obra é de 2015. Assim, foi possível perceber com mais clareza como se dá a ascensão de figuras asquerosas como o nosso presidente, que apenas legitimam o discurso de ódio que sempre esteve escondido na população. E ainda que o tema seja seríssimo - a suposta possibilidade da ascensão de uma extrema direita, o que já é REAL -, o filme utiliza o deboche como ferramenta em favor da narrativa, flertando com o absurdo e com o nonsense. [ALERTA DE SPOILER] Em uma ótima sequência em que Hitler faz ilustrações de pessoas que passam nas ruas, ele diz para um cigano não se preocupar pois haverá um "destino" para ele. Em outra, a população fica aterrorizada ao descobrir que o führer matou um cachorrinho (todo mundo esqueceu dos milhares de judeus?). E o que dizer da referência ao filme A Queda, que surge de forma inesperada e divertida? Esses pequenos instantes servem, inegavelmente, de alívio cômico, ainda que a mensagem geral seja nos fazer perceber que não adianta "matar" Hitler. Ele pode estar em cada um de nós. No vizinho. Na tia. No empresário. No estudante de administração. Em nós mesmos, cheios de preconceitos. "Eu não menti para o povo, eles sabiam EXATAMENTE por que estavam votando em mim", lembra Hitler a Fabian em uma das últimas sequências. E é isso que fica em tempos e Bolsonaro. Ele pode até ir parar na lata de lixo da história política, mais adiante. Mas as suas ideias estapafúrdias não morrem. Podendo renascer daqui a... 30, 50 ou 70 anos.



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