Policiais chegaram perto da ilha, mas avistaram os aborígenes armados com arco e flecha para recebê-los; antropólogos dizem que a melhor coisa a se fazer é não tentar se aproximar da tribo Sentinela, porque haverá um ataque.
No Instagram, @johnachau descrevia a si mesmo como 'um sobrevivente de picada de cobra' e 'paramédico da natureza selvagem' — Foto: Reprodução/Instagram/ John Chau
Policiais da Índia tiveram um tenso "cara a cara" com a tribo isolada da ilha Sentinela do Norte, onde testemunhas afirmam que foi morto a flechadas o americano John Allen Chau, de 27 anos.
A fim de tentar resgatar o corpo do jovem, o governo indiano enviou uma unidade de polícia para a ilha remota do arquipélago de Andaman e Nicobar, no oceano Índico, mas os agentes pararam o barco a cerca de 400 metros da costa.
De binóculos, viram o que os esperava na praia: homens armados com arcos e flechas - as mesmas armas que foram utilizadas para matar Chau, segundo pescadores que levaram o americano à ilha, cuja entrada é proibida.
"Eles ficaram olhando para nós e nós estávamos olhando para eles", disse à agência de notícias AFP o diretor-geral da polícia no arquipélago, Dependra Pathak. A polícia decidiu então ir embora para evitar um confronto.
Essa primeira abordagem destaca a dificuldade da tarefa de recuperar o corpo numa ilha alheia ao mundo moderno e guardada por uma tribo que não costuma receber bem estrangeiros.
Primeiros passos
Para a polícia indiana, os aborígenes pareciam estar observando alguma coisa, provavelmente o corpo do americano.
Pescadores locais que ajudaram Chau a chegar à ilha dizem que testemunharam membros da tribo enterrarem o jovem na praia
Chau queria contatar a tribo para divulgar o cristianismo, de acordo com as anotações que ele deixou antes de sair e que foram divulgadas pela imprensa local.
"Nós mapeamos a área com a ajuda desses pescadores, ainda não vimos o corpo, mas sabemos mais ou menos a área onde se acredita que ele foi enterrado", disse o chefe da polícia regional.
O governo indiano enfrenta agora um dilema complicado: como recuperar o corpo de Chau e, assim, determinar o que aconteceu, protegendo ao mesmo tempo a cultura dos aborígenes, como manda a lei.
Mapa mostra onde fica a Ilha Sentinela do Norte — Foto: Infografia: Rodrigo Cunha/G1
Sem imunidade
Para tentar uma aproximação com a tribo sem perturbá-la, já que ela é uma das últimas sem contato com o mundo exterior, o governo indiano buscou ajuda de especialistas.
A tribo da Ilha Sentinela ainda é um mistério. Não se sabe que língua eles falam, nem em quantos são.
Estima-se que existam apenas entre 50 e 150 pessoas no local, proibido para visitas devido de contaminação com doenças estrangeiras.
"Sem imunidade, qualquer vírus pode matar toda a tribo", diz o editor da BBC em Delhi, Ayeshea Perera.
Sentineles têm um histórico de ataques a pessoas de fora de sua comunidade. Em 2006, dois pescadores que acabaram nas costas da ilha foram mortos.
A tribo da ilha de Sentinela mostrou objeção a conviver com estranhos, de acordo com especialistas — Foto: Indian Coast Guard/Survival International
Uma semana depois de sua morte, os corpos de dois índios foram pendurados em estacas de bambu com vista para o mar.
"Parecia um espantalho", lembrou o chefe de polícia, falando à agência de notícias AFP. "Ainda estamos tentando entender a psicologia do grupo", afirmou.
Especialistas pedem cautela e alguns acham uma tarefa "quase impossível" recuperar o corpo de Chau.
"Você não pode enviar as Forças Armadas e pegar o corpo. Não funciona assim, tem que ir com muita precaução", disse ao jornal "The New York Times" o antropólogo T.N. Pandit, que visitou a ilha anos atrás.
Falta de informação
A falta de informação sobre os sentineles, que se acredita ser a última tribo dos descendentes dos primeiros humanos a chegarem à Ásia, é uma das maiores dificuldades.
"Não temos ideia sobre seus sistemas de comunicação, sua história ou sua cultura, ou como podemos nos aproximar", disse Anup Kapoor, antropólogo da Universidade de Delhi, à AFP.
Segundo ele, a única coisa que se sabe sobre os sentineles é que foram mortos e perseguidos pelos ingleses e japoneses, por isso "odeiam quem anda de uniforme".
É mais um motivo para alguns especialistas pedirem que as autoridades nem sequer tentem ir recuperar o corpo de Chau
"Eu não acredito que haja uma maneira certa de recuperar o corpo sem colocar em risco tanto os sentinelas quanto aqueles que vão tentar (recuperar o corpo)", disse Sophie Grig, pesquisadora-sênior da organização Survival International, que defende os direitos deste tipo de comunidades.
O antropólogo Kapoor concorda: "Deixe-os ser como são (...) Não os incomode porque a única coisa que vamos conseguir é que eles se tornem mais agressivos".
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