Ex-BBB foi condenado em 1ª instância pela 7ª Vara Criminal da capital. O g1 conversou com a advogada criminalista Mayra Carrillo para tirar dúvidas sobre o caso. Arquiteto diz que é inocente e que vai recorrer.
Por Gustavo Honório, g1 SP — São Paulo
19/07/2023
Felipe Prior é o décimo eliminado do 'BBB20' — Foto:
Reprodução/Globo
No início do mês, a Justiça de São Paulo condenou o ex-BBB
Felipe Prior a seis anos de reclusão pelo crime de estupro. A decisão da 7ª
Vara Criminal da capital fixou o regime inicial de cumprimento de pena como
semiaberto e concedeu o direito de o arquiteto recorrer da decisão em
liberdade.
Em nota, os advogados de Prior disseram que o cliente é
inocente e que vão recorrer da decisão (confira a íntegra abaixo).
O g1 conversou com a advogada criminalista Mayra Maloffre
Ribeiro Carrillo para entender por que Prior está em liberdade mesmo com uma
condenação por estupro em 1ª instância.
Por que Prior está em liberdade?
A juíza que proferiu a sentença justificou a decisão da
seguinte forma: "considerando que o réu respondeu a todo o processo em
liberdade, faculto-lhe o direito de recorrer em liberdade".
Segundo Mayra Carrillo, a regra é: quem responde solto o
processo, recorre solto: "A prisão é exceção. Segundo a nossa Constituição
Federal, todo mundo é presumidamente inocente até o trânsito em julgado da
sentença penal condenatória".
Por que a juíza aplicou a pena mínima para o crime de
estupro?
Para justificar a aplicação da pena mínima (seis anos) para
o crime de estupro, no caso de Prior, a magistrada considerou os seguintes
elementos:
O réu é primário, ou seja, não possui nenhuma sentença penal
condenatória transitada em julgado.
O réu possui bons antecedentes.
O réu possui residência fixa e emprego lícito.
Segunda ela, as circunstâncias do crime "não escapam ao
que de ordinário se verifica em crimes dessa natureza".
“Não é que falaram que ele está morando lá no Paraguai, no
Uruguai, nos Estados Unidos, e vai se evadir do distrito da culpa. Isso seria
um risco à aplicação da lei penal, que são os requisitos da prisão preventiva”,
exemplificou Mayra, que é sócia do Damiani Sociedade de Advogados.
O que é uma sentença penal condenatória transitada em
julgado?
Uma sentença penal condenatória transitada em julgado é uma
decisão definitiva, que não pode mais ser objeto de recurso em nenhum tribunal
brasileiro.
No caso do processo em que Prior foi condenado, a defesa do
arquiteto pode recorrer ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo com um
recurso de apelação.
Caso o TJ-SP confirme a decisão de primeira instância, os
advogados podem recorrer aos tribunais superiores — no Superior Tribunal de
Justiça (STJ), por meio de recurso especial, e no Supremo Tribunal Federal
(STF), por meio de recurso extraordinário.
"Só quando não couber mais nenhum recurso, quando
transitar em julgado, aí que vai expedir guia de recolhimento, e o réu pode
começar o cumprimento da pena", explicou a advogada.
O fato de Prior ser réu em outro processo e investigado em
outros dois invalida os bons antecedentes?
Não. Segundo Mayra Carrillo, uma investigação não pode ser
considerada como mau antecedente. "O réu não foi condenado nos outros
procedimentos", disse.
Prior pode ser preso antes do trânsito em julgado da
sentença?
Sim. Isso pode acontecer caso a Justiça entenda que o
arquiteto não cumpre mais os requisitos necessários para recorrer em liberdade,
ou seja, caso considere que ele preenche os requisitos da prisão preventiva.
De acordo com o artigo 312 do Código de Processo Penal, a
prisão preventiva poderá ser decretada como: garantia da ordem pública, por
conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal,
quando houver prova de existência do crime e indícios suficientes da autoria.
Por que Prior responde em liberdade mesmo sendo condenado
por um crime hediondo?
Segundo a advogada, que também é especialista em direito
penal econômico e europeu, o simples fato de crime de estupro ser hediondo não
justifica a aplicação da pena antes do trânsito em julgado.
"A gravidade do crime já está antevista no próprio tipo
penal, que começa com pena de seis anos, que é grave. O réu não extrapola a
conduta ilícita que já é prevista no próprio crime. Isso é baseado no artigo 5º
da Constituição Federal e nos tratados internacionais e convenções de direitos
humanos que o Brasil é signatário", afirmou.
Por que o regime adotado foi o semiaberto?
A pena aplicada pela magistrada da 7ª Vara Criminal da
capital foi de seis anos de reclusão.
De acordo com o Código Penal, o condenado não reincidente,
cuja pena seja superior a quatro anos e não exceda a oito, poderá, desde o
princípio, cumpri-la em regime semiaberto.
"Ninguém é preso na sentença de 1ª instância apenas
para cumprir a pena, mas por questões de prisão cautelar, ou seja, algo na
conduta dele preencheu os requisitos da prisão preventiva", apontou Mayra.
Mulher que denunciou Prior deu detalhes da noite do crime
Themis* conheceu Prior ainda na idade escolar, durante um
ano letivo em que estudaram no mesmo colégio. Depois, voltaram a conviver
quando ela ingressou no curso de arquitetura da Universidade Presbiteriana
Mackenzie, no Centro da capital paulista.
Apesar disso, ela afirmou que nunca teve um vínculo de
amizade com ele, já que cursavam períodos diferentes. Prior passou a oferecer
caronas a ela e a uma amiga durante alguns meses, já que moravam em regiões
próximas.
*Nome fictício adotado pela defesa a fim de preservar a
identidade da vítima.
Advogada de quatro mulheres que denunciam Felipe Prior por
estupro diz que ex-BBB será condenado a 24 anos de prisão, no mínimo
A madrugada do crime
No dia 8 de agosto de 2014, Themis foi com uma amiga a uma
festa universitária que antecedia o InterFAU, competição esportiva em que
participam diversas turmas de faculdades de Arquitetura e Urbanismo do estado
de São Paulo. O evento aconteceu na Cidade Universitária da Universidade de São
Paulo (USP).
Themis disse que, a princípio, não suspeitou de nada porque
já conhecia Prior há bastante tempo: "Eu já tinha pegado carona com ele
diversas vezes, não me parecia um risco, que algo pudesse acontecer".
O crime
"A gente estava voltando da festa, ele deixou primeiro
a minha amiga na casa dela. Quando a gente estava indo sentido à minha casa,
ele parou o carro no meio da rua, desafivelou meu cinto, começou a me beijar. A
rua estava muito escura, já era de madrugada", disse.
"Ele foi para o banco de trás e me puxou. E eu fui",
relembrou Themis.
"Começou a tirar minha roupa e, à medida que as coisas
iam acontecendo, ele se tornava cada vez mais agressivo comigo. Ele começou a
falar para eu parar de me fazer de difícil, que é claro que eu queria, que
agora não era hora de falar que não e começou a forçar a penetração."
Depois do crime
Ao chegar em casa, Themis disse que foi direto para o
banheiro e tentou estancar sozinha o sangue, mas não conseguiu, porque estava
com a pressão baixa.
"Fui acordar minha mãe e pedi para ela me ajudar. Ela
deu uma olhada no machucado, levantou e falou: 'A gente vai para o
hospital'."
Na unidade de saúde, a jovem foi atendida por uma médica que
atestou o ferimento: uma laceração de grau 1 — compatível com fricção de pênis
ou introdução de outro instrumento na vagina.
Três anos depois, caiu a ficha: 'Ele tinha me estuprado'
"Em 2017, se não me engano, começou um movimento do Me
Too, que bombou na internet. Eu comecei a entrar em contato com todos esses
relatos, essas denúncias de mulheres, e consegui conversar com as minhas amigas
sobre isso. Foi quando caiu a ficha que eu tinha sido estuprada", disse
Themis.
"Foi quando realmente caiu a ficha de que não era minha
culpa. Que não era minha responsabilidade. Que eu não tinha feito nada de
errado e que ele tinha me estuprado."
BBB 20 e a denúncia
Felipe Prior foi o 10º eliminado do Big Brother Brasil 20,
no paredão mais votado da história do programa — mais de 1,5 bilhão de votos.
Quando o arquiteto apareceu na televisão, Themis voltou imediatamente para a
madrugada do dia 8 de agosto de 2014.
"Eu tive uma crise de ansiedade esse dia. Eu estava com
meu companheiro, que hoje é meu marido. Vi o rosto dele [Prior] pela primeira
vez em muitos anos. Tudo o que remetia a ele, eu apaguei da minha vida. E eu vi
o rosto dele, aquilo me causou um choque muito grande, um medo de novo."
Segundo ela, a decisão de denunciar Prior após seis anos do
crime se deu depois que começou a receber das amigas prints de tuítes de outras
mulheres relatando que já haviam passado por situações muito semelhantes.
O que diz a defesa de Prior
Procurados pelo g1 e pelo Fantástico, os advogados de Felipe
Prior enviaram a seguinte nota:
"A defesa e o próprio Felipe seguem plenamente
confiantes no Poder Judiciário brasileiro e, assim, na reforma de sua injusta
condenação, visto que restou patentemente demonstrada a inocência de Felipe
pelas provas apresentadas no bojo processual, que, lamentavelmente, vêm sendo
ventiladas de forma deturpada e em desrespeito ao segredo de justiça decretado
em relação à tramitação processual – fato este que, também, será objeto das
providências legais pertinentes.
Reafirmando-se a plena inocência de Felipe Antoniazzi Prior, sua defesa informa que, no momento oportuno e através de alguns veículos, Felipe se manifestará esclarecendo os fatos distorcidos e inverídicos apresentados como resposta para os demais veículos de comunicação."
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