segunda-feira, 24 de junho de 2013

PEC 37: As pessoas sabem contra o que estão

PEC 37: As pessoas sabem contra o que estão protestando?
http://veja.abril.com.br/multimidia/video/pec-37-as-pessoas-sabem-contra-o-que-estao-protestando


 Cerca de 35.000 pessoas foram as ruas de São Paulo no sábado protestar contra a PEC 37. Mas muita gente ainda não sabe ao certo do que se trata essa proposta de emenda constitucional.




Temas

PEC das Domésticas

São Paulo

Rio de Janeiro - Manifestantes fazem protesto em Copacabana contra a PEC 37

POR QUE SOU A FAVOR DA PEC 37?


            Porque sou delegado de polícia, corporativista e "farinha pro meu pirão primeiro"? Essa seria a resposta imediata dos que dizem "não" à PEC 37, ou como a batizaram os membros do Ministério Público, a "PEC da impunidade".
            Não é nada disso. A PEC 37, ou Proposta de Emenda Constitucional nº 37-A, de 2011, de autoria do deputado federal pelo Maranhão, Lourival Mendes, que é delegado de polícia naquele Estado, simplesmente pretende acrescentar um parágrafo ao artigo 144 da Constituição Federal (e por isso, Emenda à Constituição), que trata da organização da Segurança Pública no Brasil, que deixe bastante claro que a missão de investigar crimes é da Polícia judiciária, ou seja, da Polícia Federal e das Polícias Civis dos Estados e a do Distrito Federal, aliás, entendimento esse que já vem sendo manifestado pelo próprio Supremo Tribunal Federal, em recente julgamento noticiado amplamente, onde o Ministro Cezar Peluso, em seu voto, afirma "no quadro das razões constitucionais, a instituição que investiga não promove ação penal e a que promove, não investiga”.

            O acréscimo do § 10 ao art. 144 proposto pela PEC 37 tem o seguinte texto:

"A apuração das infrações penais de que tratam os §§ 1º e 4º deste artigo, incubem privativamente às polícias federal e civis dos Estados e do Distrito Federal, respectivamente."

            Portanto, o que se pretende é deixar claro, o que ainda é nebuloso, a qual, ou quais, Instituições competem a apuração da infrações penais, a fim de que essa função possa ser regulamentada sem que o Poder Judiciário, a todo o momento, seja instado a se pronunciar sobre a ilegalidade de investigações promovidas por outras Instituições.

            É uma mera questão de ordenamento jurídico que visa dar garantias à cidadania. Quantas vezes cidadãos, até mesmo advogados, peticionam ao Ministério Público requerendo a propositura de uma ação penal e este encaminha a representação para a Delegacia de Polícia, a fim de que o delegado de polícia instaure o inquérito policial? Isso consome tempo, e em alguns casos os vestígios se apagam e a impunidade se estabelece.

            A PEC 37 norteia a comunidade jurídica e sinaliza aos cidadãos o caminho a ser seguido, sem que ele perca tempo batendo em portas erradas ao pretender ver processado alguém que tenha lesado sua integridade física, seu patrimônio, sua honra, etc.

            Outro ponto importantíssimo a se destacar, e a refutar a maldosa ideia de que mas nenhum outro Órgão ou Instituição poderá realizar atos investigatórios, é remetê-los ao texto da PEC 37 e ressaltar que ela confere PRIVATIVIDADE às Polícias judiciárias, e não EXCLUSIVIDADE. O próprio texto das razões que a justificam já destaca que as investigações criminais levadas a efeito pelas Comissões Parlamentares de Inquérito, definidas na própria Constituição Federal, não sofrem qualquer alteração, ou seja, as CPIs ou as CPMIs, continuarão com o poder de investigar os fatos que interessam à República e à democracia brasileiras.

            Em Direito sabemos que há uma clara distinção entre o que é privativo e o que é exclusivo, em termos de competência. A exclusividade ocorre quando a competência é única, enfim, quando um determinado ato só pode ser exercido por uma determinada autoridade ou Órgão, como por exemplo, a investigação dos crimes de extorsão mediante sequestro no Rio de Janeiro, cuja competência é exclusiva da Divisão Anti-Sequestro, ou seja, nenhuma outra Delegacia tem atribuição para investigar esses crimes, devido a especialidade na matéria daquela Unidade de Polícia Judiciária. Já a privatividade, como regra inferior a exclusividade, permite que aquela competência possa ser exercida por outra autoridade ou Órgão em determinadas situações, ou até mesmo concorrente. É o caso das investigações dos crimes contra a Fazenda Pública aqui também, onde a competência da Delegacia de Polícia Fazendária se dá em razão da lesão ao patrimônio público, pois sendo de pequena monta, a investigação corre pela Delegacia da circunscrição onde ocorreu o fato.

            A própria Constituição é a grande mestre a nos ensinar o conceito de privatividade, quando em seu artigo 22 regula a competência privativa da União em legislar sobre direito civil, penal, processual, etc., e lá em seu parágrafo único estabelece que os Estados poderão legislar sobre questões específicas dessas matérias, mediante autorização contida numa Lei Complementar, ou seja, o ato de conferir privatividade a alguém não impede que, em casos especiais, outro pode suplementar ou complementar aquela competência.

            Nesse clima, a PEC 37 jamais poderia conferir exclusividade às Polícias judiciárias quanto a competência de investigar as infrações penais, pois a própria Constituição confere essa mesma competência a outros Órgãos, como o caso das Comissões Parlamentares de Inquérito, as investigações levadas a efeito pelos Tribunais nos crimes comuns cometidos pelos magistrados, e pelo Ministério Público nos casos dos seus membros, etc.

            Portanto, falar em "engessar" o poder investigatório do Ministério Público é puro "estelionato" corporativista, eis que o Ministério Público jamais deteve esse tal "poder". Onde está escrito, na Constituição Federal, que o Ministério Público tem poder de investigar alguma coisa? Nesse sentido, o Constituinte de 88 conferiu ao MP apenas o poder de requisitar a realização de diligências investigatórias e a instauração de inquéritos policiais, acompanhando o seu andamento, bem como a ultra nobre missão de exercer o controle externo da atividade policial, não só a da polícia judiciária como da polícia ostensiva também.

            O Ministério Público já possui missões relevantes e destacadas no combate a impunidade, as quais têm início na própria competência de fiscalizar a atividade policial, pois o combate a impunidade começa com uma boa investigação, uma que consiga produzir as provas necessárias ao oferecimento da denúncia - ato exclusivo do MP - e a condenação do criminoso. Nem mesmo quando se trata de crimes cometidos por policiais a Constituição autoriza o MP a ele mesmo realizar as investigações, pois todas as Corporações policiais possuem uma Corregedoria interna, cabendo ao promotor de Justiça ou ao procurador da República, requisitar a instauração do competente inquérito policial ao Órgão corregedor e acompanhá-la.

            Outra falácia é essa balela de que apenas o Ministério Público, por ser uma Instituição dotada de garantias e prerrogativas constitucionais, como a independência funcional, administrativa e financeira, a inamovibilidade e a vitaliciedade, é capaz de combater o crime organizado. Ora, a Polícia Federal e seus delegados e agentes, sem nenhuma dessas garantias, vem fazendo isso de forma natural e republicana, e cito apenas o mais atual e mais comentado nos dias de hoje, que é o chamado "Esquema Carlinhos Cachoeira". Imaginem o quanto a Polícia Federal e as Polícias Civis avançariam se também fossem dotadas dessas prerrogativas e garantias funcionais?

            Também não pode encontrar eco a desculpa de que alguns países desenvolvidos conferem aos seus Ministérios Públicos a competência de investigar e, em alguns deles, a missão de comandar diretamente as investigações. Cada povo, sociedade, nação, encontra os mecanismos que se encaixam na sua cultura, mas esquecem os defensores dessa tese que o Ministério Público de lá não tem nada a ver com o nosso Ministério Público. Vejamos o caso do Ministério Público estadunidense, onde sequer existe carreira de promotor ou procurador. Aliás, pra começar, lá o MP é de nível municipal, assim como a Polícia e o próprio Poder Judiciário, coisa que aqui não existe. O promotor-chefe do Ministério Público municipal é eleito pelo povo, assim como o xerife, o Chefe da Polícia local, que recruta advogados para auxiliá-lo na missão de denunciar os criminosos à Justiça. Promotor nos EUA não presta concurso, não é carreira pública, mas sim uma carreira essencialmente política.

            A PEC 37 está longe de ser a PEC da insensatez ou da impunidade, como defendem as associações de classes dos membros do nosso Ministério Público, no qual embarcam desavisados de plantão. Eu diria que a PEC 37 está mais para a "PEC da fogueira das vaidades", ou a "PEC do holofote", pois a mídia se interessa em publicitar e novelar crimes de apelo popular para lucrar com propagandas, e os holofotes se direcionam para os atores das investigações, os policiais, os delegados de polícia.

            Nunca vi nenhum membro do Ministério Público defender a Polícia judiciária, lutar pelo seu fortalecimento, pelo seu aparelhamento e por que não dizer, pela sua independência dos governantes, alegando que não lhes adianta suas garantias e prerrogativas constitucionais de promotor ou procurador de Justiça se aquele que tem o dever, a missão, de investigar não desfruta das mesmas, alertando a sociedade de que os crimes de colarinho branco ficam impunes porque a Polícia não os investiga, e não os investiga porque delegados e agentes podem ser perseguidos e punidos pelo poder político, a que estão subordinados. O tal "esquema Carlinhos Cachoeira" descortinou essa promiscuidade de setores policiais, governantes e mafiosos.

            Mas quem disse que a elite brasileira é a favor de uma Polícia Republicana, independente e fortalecida? Dar "independência" ao juiz e ao promotor e manter o delegado subordinado aos governantes é o presente da elite brasileira a impunidade! Viram a palavra independência entre aspas? Pois é, porque como podemos falar em independência do Ministério Público, por exemplo, se o Chefe da Instituição é escolhido pelo Chefe do Poder Executivo, ou seja, pelo governante? Então, já que modelos alienígenas são exaltados, que adaptemos o nosso MP aos desses países que os adotam! Mas aí dirão "ah, o povo brasileiro não sabe votar, não está preparado pra isso, o MP virará uma Instituição político-partidária, etc. e etc." Mas então, se o modelo de MP de lá não nos serve, o modelo jurídico-penal também não há de nos servir, não é mesmo?

            A aprovação da PEC 37, inevitavelmente, exigirá a edição de uma Lei Orgânica Nacional da Polícia, aliás, legislação essa que a sociedade realmente lúcida deste país cobra há 24 anos dos nossos congressistas. A legislação que organiza as diversas Polícias judiciárias brasileiras datam das décadas de 60, 70, 80... A organização policial brasileira é uma bagunça e não tenho dúvidas de que é proposital, para permitir que servidores policiais federais e estaduais sejam manipuláveis. Assim age a nossa elite, sempre tratando o policial como servidor de quinta categoria, serviçal e mão de obra barata, jogando-o constantemente aos leões e despertando no povo humilde (eleitores, claro) verdadeiro ódio à farda e ao distintivo. A tal elite aplaude e bajula o Ministério Público como se seus membros fossem homens e mulheres especiais, diferenciados, super-heróis, defensores dos fracos e oprimidos. Por trás de um juiz, delegado ou promotor há um ser humano com vícios e virtudes. Ninguém é mais ou menos honesto que o outro por conta da carreira que escolheu seguir, por vocação. Vou apenas lembrá-los que nada mais, nada menos que o ex-procurador-geral de Justiça de Goiás, Demóstenes Torres, então senador da República, foi cassado pelo Senado por seu envolvimento com o mafioso Carlinhos Cachoeira.

            Costumo dizer que as Instituições são absolutamente perfeitas, mas infelizmente compostas por seres humanos. A organização do sistema jurídico-penal no Brasil realiza um ciclo completo de Justiça, onde a Polícia investiga, o Ministério Público denuncia e o Poder Judiciário julga, com todo o processo acompanhado pelos advogados, os quais asseguram a ampla defesa dos réus. Se falhas existem, devemos corrigi-las, mas jamais diminuir a atuação de nenhuma dessas Instituições.

*atualizado em 05/03/2013



Nenhum comentário:

Postar um comentário