Presidente reuniu embaixadores no Palácio da Alvorada para voltar a levantar suspeitas sobre o processo eleitoral
19/07/2022 04:00 - atualizado 18/07/2022 23:58
Brasília - O presidente Jair Bolsonaro (PL), que pretende disputar a reeleição em outubro, reuniu embaixadores de vários países, ontem, no Palácio da Alvorada, para criticar a eficácia das urnas eletrônicas e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ele também criticou os ministros Edson Fachin e Alexandre de Moraes, presidente e vice do TSE, respectivamente, e Luís Roberto Barroso, ex-vice-presidente da corte. Os ministros do governo Carlos França (Relações Exteriores), Paulo Sérgio Nogueira (Defesa), Ciro Nogueira (Casa Civil), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria-Geral) e Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) estavam presentes. O acesso da imprensa ficou restrito às equipes que concordaram previamente em veicular a apresentação ao vivo e na íntegra. A TV Brasil, que é emissora estatal, transmitiu o evento.
Com direito a um PowerPoint, Bolsonaro disse que sua intenção era mostrar a “realidade” das eleições de 2014 e 2018. Ele iniciou a apresentação relatando a facada recebida na pré-campanha de 2018. “Fui presidente gastando menos de 1 mi de dólares e dentro de um leito de hospital após sofrer um atentado e uma facada de um elemento de esquerda cujo inquérito não foi concluído apesar dos enormes indícios de interesses outros se fazerem presentes. Mas essa é uma questão interna nossa. Gostaria de ver esse inquérito concluído para chegar nos mandantes da tentativa de homicídio”, afirmou. Por duas vezes em investigações, a Polícia Federal concluiu que Adélio Bispo, preso no mesmo dia, agiu sozinho e que não houve mandantes no crime.
O presidente prosseguiu na investida contra o processo eleitoral afirmando querer “eleições limpas”. “O que eu mais quero para o meu Brasil é que a sua liberdade continue a valer também depois das eleições. O que eu mais quero por ocasião das eleições é a transparência. Nós queremos que o ganhador seja aquele que realmente seja votado. Nós temos um sistema eleitoral que apenas dois países do mundo usam”, alegou.
“Queremos eleições limpas, transparentes, onde o eleito realmente reflita a vontade da sua população”. Bolsonaro, então, citou o inquérito aberto pela Polícia Federal em 2018, na Superintendência Regional do Distrito Federal, após ser acionada pelo TSE. A motivação foi a suposta invasão de um hacker ao Sistema Gerenciador de Dados, Aplicativos e Interface com a Urna Eletrônica (GEDAI-UE) – aplicativo que permite a instalação na urna das listas com os nomes e dados dos candidatos, junto com o software do sistema de votação, além de registrar a presença dos eleitores –, e ainda o acesso a documentos sigilosos do Tribunal Superior Eleitoral.
O inquérito mostra que foram adotadas várias diligências diferentes pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal para a investigação do caso, mas não há conclusão ou suspeita de que as urnas eletrônicas tenham sido comprometidas. Desde o início do voto eletrônico no Brasil, em 1996, nenhum caso de fraude foi identificado e comprovado.
“Quero me basear exclusivamente no inquérito da PF que foi aberto após o segundo turno das eleições de 2018, onde um hacker falou que tinha havido fraude por ocasião das eleições. Falou que ele e o grupo dele tinham invadido o TSE”, afirmou o presidente.
“É hora de dizer basta”, afirma presidente do TSE
Brasília - O ministro Edson Fachin, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), reagiu aos novos ataques do presidente Jair Bolsonaro às urnas eletrônicas e ao Judiciário, na reunião com embaixadores realizada ontem no Palácio da Alvorada. O magistrado disse que há um “inaceitável negacionismo eleitoral” por parte do chefe do Executivo e seus apoiadores mais radicais e afirmou que é “hora de dizer basta” para os ataques. Fachin reiterou que não há nenhum indício de fraude nas urnas eletrônicas. “A Justiça Eleitoral está preparada e conduzirá a eleição de 2022 de forma limpa e transparente. Como vem fazendo nos últimos 90 anos. E nos últimos 26 anos de forma eletrônica para votação”, afirmou.
“Há um inaceitável negacionismo eleitoral por parte de uma personalidade importante dentro de um país democrático, e é muito grave a acusação de fraude a uma instituição, mais uma vez, sem apresentar provas”, disse. A reação de Fachin ocorreu durante palestra em evento da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Paraná. Segundo ele, o Judiciário se manteve à disposição do diálogo com o Executivo, sem necessidade de ataque.
“Sempre estivemos abertos ao diálogo, nenhum ataque pessoal ou à instituição foi ‘contra-atacado’. Sempre houve a condução disciplinada e educadora com intuito de informar ao eleitorado a respeito do processo eleitoral e a função e capacidade do TSE e da Justiça Eleitoral como um todo, sua segurança, transparência e eficácia”, disse ele também.
O ministro lamentou a tensão entre os Poderes. “Porém, neste momento, mais uma vez a Justiça Eleitoral e seus representantes máximos são atacados com acusações de fraude, ou seja, uso de má-fé. Ainda mais grave, é o envolvimento da política internacional e também das Forças Armadas, cujo relevante papel constitucional a ninguém cabe negar como instituições nacionais, regulares e permanentes do Estado, e não de um governo. É hora de dizer basta”, afirmou também o presidente do TSE. (Luana Patriolino)
Senador defende urnas eletrônicas
Brasília - O presidente do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), também reagiu às acusações sem provas do presidente Jair Bolsonaro e defendeu a lisura do processo eleitoral. Ele divulgou nota à imprensa após o encontro de Bolsonaro com embaixadores no Palácio da Alvorada para questionar as urnas eletrônicas. “Uma democracia forte se faz com respeito ao contraditório e à divergência, independentemente do tema. Mas há obviedades e questões superadas, inclusive já assimiladas pela sociedade brasileira, que não mais admitem discussão. A segurança das urnas eletrônicas e a lisura do processo eleitoral não podem mais ser colocadas em dúvida”, disse.
O senador afirmou também que não há razão para os questionamentos ao sistema eleitoral, que classificou como “ruins para o Brasil sob todos os aspectos”. Pacheco voltou a dizer que o Congresso, eleito pelo sistema eletrônico, “tem obrigação de afirmar à população que as urnas eletrônicas darão ao país o resultado fiel da vontade do povo, seja qual for”.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pré-candidato à Presidência, afirmou pelas redes sociais: “É uma pena que o Brasil não tenha um presidente que chame 50 embaixadores para falar sobre algo que interesse ao país. Emprego, desenvolvimento ou combate à fome, por exemplo. Ao invés disso, conta mentiras contra nossa democracia.”
Ciro Gomes, presidenciável pelo PDT, declarou: “Depois do horrendo espetáculo promovido, hoje, por Bolsonaro, ele não pode ser mais presidente de uma das maiores democracias do mundo ou o Brasil não pode mais se dizer integrante do grupo de países democráticos. Nunca, em toda história moderna, o presidente de um importante país democrático convocou o corpo diplomático para proferir ameaças contra a democracia e desfilar mentiras tentando atingir o Poder Judiciário e o sistema eleitoral. Bolsonaro cometeu vários crimes de responsabilidade”.
A também presidenciável Simone Tebet (MDB-MS), afirmou: “O Brasil passa vergonha diante do mundo. O presidente convocou embaixadores e utilizou de meios oficiais e públicos para desacreditar mais uma vez o sistema eleitoral brasileiro. Reforço minha confiança na Justiça Eleitoral e no sistema de votação por urnas eletrônicas. Convido os demais candidatos a fazerem o mesmo”.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) saiu em defesa do pai. “Toda a instabilidade jurídica e política no Brasil é consequência da intolerância do TSE em aprimorar o sistema de votação, o que causa desconfiança. No mesmo segundo que aceitarem as sugestões técnicas de especialistas (+ segurança e transparência) tudo estará resolvido”.
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