Em vídeo conseguido com exclusividade pelo Fantástico, sargento Gouveia relata desgaste com vítima. Especialista alerta para agravamento da questão mental entre policiais.
Por Fantástico
21/05/2023 21h00
Atualizado há 9 horas
4 de 15 testemunhas afirmaram que o atirador vinha reclamando das escalas de trabalho dele e da esposa, que é PM na mesma companhia.
O Fantástico teve acesso com exclusividade a um vídeo do sargento
O Fantástico teve acesso com exclusividade a um vídeo do
sargento Claudio Henrique Frare Gouveia, 53 anos, logo após ele matar dois
colegas de farda dentro do batalhão de Salto, no interior Paulista.
Apontado como uma pessoa tranquila, Gouveia atirou com um
fuzil contra o sargento Roberto da Silva e o capitão Josias Justi no dia 15 de
maio. Ele se entregou em seguida.
Como foi o crime
no turno da manhã, o sargento Gouveia diz a outros PMS que
haveria um treinamento externo e pede para que deixem a companhia;
logo após, ele tranca a porta;
armado com um fuzil, vai para sala onde estão o capitão e o
sargento e dispara nove vezes;
Gouveia se entrega em seguida, sem nenhuma resistência;
Nas imagens obtidas pelo Fantástico, é possível ver o
policial logo após os disparos. Já algemado, ele diz que era perseguido pelo
capitão Justi.
Globo.com: leia as principais notícias do dia
“Não aguento mais. Não estou dormindo. Meu casamento
acabou”, diz Claudio Henrique Gouveia.
Vídeo conseguido com exclusividade pelo Fantástico mostra o sargento Gouveia logo após atirar contra os colegas. — Foto: TV Globo/Reprodução
Quinze testemunhas prestaram depoimento e ao menos quatro
afirmaram que o sargento vinha reclamando das escalas de trabalho dele e da
esposa, que também é PM na mesma companhia, e que isso estaria prejudicando
muito a rotina familiar.
“Ele não devia ter destruído a minha vida, ele destruiu a
minha vida. Então é isso aí, elas por elas. Esse é o motivo pelo qual aconteceu.
Porque em nenhum momento ele voltou atrás e ninguém transferiu esse cara daqui.
Então, eu não tenho o que fazer. Acabou. Se alguém quiser ouvir é isso aí, esse
é o depoimento, tá bom? Muito obrigado”, falou o policial logo após o ocorrido.
Saúde mental em jogo
Até matar os colegas, o sargento Gouveia era conhecido por
outro tipo de comportamento e se destacou na internet pelo jeito gentil de
fazer as abordagens. Na folga, aproveitava para jogar hóquei com a família e
era instrutor de patinação.
Sargento tinha fama de ser gentil em abordagens e tinha vídeos publicados na internet. — Foto: TV Globo/Reprodução
Para tentar entender o que levaria um pai de seis filhos,
conhecido por ser controlado nas abordagens e sem nenhum histórico de
violência, a matar à queima roupa dois colegas de trabalho, o Fantástico
conversou com a psicóloga Juliana Martins, coordernadora do Fórum Brasileiro de
Segurança Pública.
“É muito comum que as organizações policiais
individualizarem o problema, tratando a questão como algo do indivíduo, de que
ele teve um problema pontual, como um acesso de raiva ou um desvio”, explica.
Segundo ela, a abordagem sobre saúde mental precisa mudar na
corporação e alguns pontos precisam ser desmistificados, para que o
profissional não seja perseguido por causa de um diagnóstico.
“Não dá pra gente falar de cuidado sem falar da valorização
desses profissionais. Não adianta você pagar um mau salário, ter escalas de
trabalho abusivas e ter um psicólogo para atender”, diz Juliana.
O que diz a corporação
Procurada, a Polícia Militar de São Paulo não quis comentar
o crime. Mas números da própria corporação apontam que existem 80 mil PMs na
ativa e são concedidos, em média, quatro afastamentos por dia por questões
psiquiátricas. Entre 2019 e abril de 2023, foram 5,6 mil licenças.
Adriana Nunes Nogueira, tenente-coronel e psicóloga-chefe do
Centro de Atenção Psicossocial da PM paulista disse que o sistema acolhe menos
de 1% da instituição.
"Não é porque não temos estrutura para isso, mas é que
temos outros fatores de proteção, como a inspeção anual de saúde, onde ele se
submete à uma avaliação médica, e essa avaliação permite que ele possa identificar
alguns fatores que ele precisa cuidar. Ele pode procurar um psicólogo civil ou
militar. Medidas estão sendo adotadas para a gente ampliar a prestação de
serviços", disse.
Em nota, familiares da vítima disseram que as alegações do atirador são infundadas. — Foto: TV Globo/Reprodução
Procuradas pela reportagem, as famílias das duas vítimas do
crime em Salto não quiseram falar. Parentes do capitão Justi, no entanto,
enviaram uma nota afirmando que ele foi vítima de uma “barbárie” e que estão em
estado de “profunda tristeza”. Também disseram que não permitirão que falácias
infundadas manchem seu legado e honra.
Nenhum comentário:
Postar um comentário