De 3.171 registros de morte analisados pelos pesquisadores que participaram do estudo ‘Pele Alvo: a bala não erra o negro’ que tinham a cor declarada, os pretos eram 2.770 pessoas, ou 87,35% dos mortos.
Por Cristina Boeckel, Rafael Nascimento, g1 Rio
16/11/2023
Um estudo divulgado nesta quinta-feira (16) mostra que 1
pessoa negra foi morta por intervenção policial a cada 4 horas em 8 estados do
país no ano passado. A pesquisa é da Rede de Observatórios, com base em dados
divulgados pelas secretarias de segurança pública por meio da Lei de Acesso à
Informação (LAI).
De 3.171 registros de morte analisados pelos pesquisadores
que participaram do estudo “Pele Alvo: a bala não erra o negro” que tinham a
cor declarada, os pretos eram 2.770 pessoas, ou 87,35%.
A subnotificação da informação racial dos mortos por
intervenção policial chamou a atenção dos pesquisadores. Das 4.219 ocorrências
vistas por eles, 1 em cada 4 não tinha a informação sobre cor.
“É necessário tomar a letalidade de pessoas negras causada por
policiais como uma questão política e social. As mortes em ação também trazem
prejuízos às próprias corporações que as produzem. Precisamos alocar recursos
que garantam uma política pública que efetivamente traga segurança para toda a
população”, afirmou a cientista social Silvia Ramos, coordenadora da Rede de
Observatórios.
Bahia e Rio de Janeiro lideram
Os estados pesquisados foram Bahia, Ceará, Maranhão, Pará,
Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro e São Paulo, onde a Rede de Observatórios tem
escritórios.
De todos, a Bahia lidera o número de mortes de pessoas de
pele negra, com 1.121. O estado assumiu a liderança do ranking de morte de
negros por intervenção do Estado entre 2021 e 2022.
A maioria dos mortos, 74,21% deles, tinha idade entre 18 e
29 anos. Apenas a cidade de Salvador teve a morte de 438 pessoas nestas
condições, sendo 394 negras.
Outro dado sobre a Bahia que chamou a atenção é as mortes
como fruto da violência policial, que cresceram 300% entre 2015 e 2022.
Quem tinha a maior incidência deste tipo de crime contra negros e caiu para o segundo lugar desde então é o Rio de Janeiro, com 1.042 mortos. Juntos, os dois estados são responsáveis por 66,23% dos óbitos do estudo.
Ruan do Nascimento morreu após ser atingido por um tiro de
fuzil depois de sair de casa para cortar cabelo em uma barbearia perto de onde
morava, na Barreira do Vasco, na Zona Norte do Rio. Ele tinha deficiência
intelectual.
A mãe de Ruan, a camareira Bianca Alves Limão, contou que
policiais militares entraram atirando na Rua Ricardo Machado pouco antes do
jovem de 27 anos ser atingido.
"Somos negros, pobres e moradores de comunidade. A
polícia vem aqui e faz o que faz achando que todos nós somos bandidos,
traficantes. Infelizmente, temos que aguentar e pedir a Deus para não ser morto
pela polícia. O meu filho foi morto por quem deveria nos proteger”, disse
Bianca.
Ruan do Nascimento, de 27 anos, baleado na Barreira do Vasco
— Foto: Reprodução Redes Sociais
O estudo mostra que, no Estado de São Paulo, houve uma
redução de 48,32% no número de mortes: foram 867 vítimas em 2021 e 419 no ano
passado. Destas, 63,90% são negras.
Os pesquisadores atribuem uma queda tão grande a uma
política de redução da letalidade aliada ao uso de câmeras corporais.
A capital paulista representa 37,47% do total de casos, com
157 mortes. Santos é a segunda cidade com o maior número de casos, com 16
vítimas.
Subnotificação
A pesquisa da Rede de Observatórios destaca que a letalidade
da população negra em casos de violência policial pode ser maior do que a
divulgada por conta da subnotificação e pela falta de detalhes sobre raça que,
de acordo com os estudiosos, acontece principalmente em três estados: Maranhão,
Ceará e Pará.
De acordo com o estudo, o Maranhão não inclui esses dados
pelo menos desde 2020. No Ceará, os registros foram feitos em apenas 30,26% do
total. No Pará, em 33,75%.
No Ceará, ficou constatado que em 69,74% das 152 mortes não
foram identificadas informações sobre cor. Nos casos que tinham o dado, 80,43%
das mortes foram de pessoas negras e sete de cada dez vítimas tinham entre 18 e
29 anos.
No Pará, a informação sobre raça foi omitida em 66,24% das
vítimas. Mas, entre os casos em que é identificada, as pessoas negras
representam 93,90% das mortes por intervenção policial.
A capital, Belém, tem o maior número de mortes por
intervenção policial, com 83 casos, seguida pela cidade de Parauapebas, com 41.
Vítimas jovens
Em Pernambuco, dos 87 homicídios por intervenção policial
foram registrados. Todos os mortos em Recife no ano passado eram negros. A
idade chamou a atenção dos pesquisadores pois, 67,03% das vítimas no estado
tinham idade entre 12 e 29 anos.
No Piauí, Teresina teve mais da metade das mortes por ação
de policiais no estado. EM todo o território piauiense foram 39 mortes
analisadas pelo estudo e 22 delas (56,41%) na capital.
No total das mortes, 88,24% eram negras.
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