Comando Militar do Leste diz que procedimento seria para checar antecedentes e já foi utilizado em outras operações. Para Defensoria Pública, método não tem amparo legal.
Por Nicolás Satriano, G1 Rio
Durante a operação deflagrada nas comunidades da Vila Kennedy, Vila Aliança e Coreia, na Zona Oeste do Rio, nesta sexta-feira (23), militares das Forças Armadas tiraram fotos de moradores com seus documentos para checar se eles tinham antecendentes criminais,
O chefe da comunicação social do Comando Militar do Leste, Carlos Frederico Cinelli, disse ao G1 que o procedimento já foi feito em outras ocasiões - sem especificar quais -, e que o método segue amparo do decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), assinado pelo presidente Michel Temer em junho do ano passado.
Fuzileiros navais identificam moradores favela da Vila Kennedy, na zona oeste do Rio de Janeiro, fotografando o documento de identidade e o rosto de cada um durante operação realizada na comunidade, nesta sexta-feira, 23 (Foto: Wilton Junior/Estadão Conteúdo)
Ainda assim, o oficial acrescentou que há dúvidas sobre a conduta que estão sendo analisadas pela assessoria jurídica do CML. Cinelli também explicou que a ação desta sexta foi realizada junto com a Polícia Civil, e que as fotos não permaneceriam de forma alguma em posse dos militares. O oficial disse que há ordem expressa para que os arquivos sejam apagados.
"É um procedimento que vem sendo feito. A Defensoria [Pública do Rio de Janeiro] diz que tem que haver fundada suspeita. Na ocasião, parece que a tropa deve ter verificado essa fundada suspeita", argumentou o coronel.
A Defensoria Pública contesta o método dos militares. A defensora Lívia Casseres, do Núcleo de Direitos Humanos, disse que no entendimento da Defensoria não há amparo legal. Ela avalia que a ação desta sexta demonstra que toda a comunidade tem sido tratada como suspeita.
"Estão realizando esse procedimento de maneira generalizada. Está sendo feito em todo e qualquer morador. O CPP [Código de Processo Penal] define que essas pessoas que forem abordadas devem ter fundada suspeita, o que exige elementos objetivos nos quais esses agentes precisam se apoiar. E isso não acontece. O que a gente vê é que a comunidade como um todo é tratada como suspeito"
A defensora orienta que moradores que se sintam constrangidos ou forem vítimas de violência institucional procurem o Núcleo de Direitos Humanos, que fica no número 11 da Rua México no Centro do Rio. Por enquanto, ela disse que o núcleo não recebeu reclamações desde que o estado passou a estar sob intervenção federal na área da segurança e acrescenta que, por ora, o órgão não teve a oportunidade de dialogar com a autoridade interventora.
Em nota, o Ministério Público também se pronunciou sobre o procedimento dos militares. O órgão citou que na sistemática da Constituição de 1988, o artigo 5º define que "o civilmente identificado não será submetido a identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei".
"Em outras palavras, não serão colhidas as impressões datiloscópicas, pela autoridade competente, em relação àqueles que apresentem a sua identificação civil", esclarece o texto do MP.
Para o Ministério Público, a conduta dos agentes das Forças Armadas "não procede à investigação criminal, o que é vedado pela ordem constitucional". O órgão acredita que os militares adotaram tais medidas para "tornar viável o cumprimento de mandados de prisão".
Em relação às fotos, o MP avaliou que o procedimento pode ser justificado "pelo fato de a fisionomia apresentar variações com o passar do tempo, o que pode facilitar as buscas de possível enquadramento da pessoa nas características físicas de outros procurados, bem como confirmar a higidez de sua identificação civil, afastando qualquer suspeita de falsidade".
O órgão também informa que "os possíveis excessos praticados pelos integrantes das Forças Armadas, ensejando a responsabilização pessoal de seus integrantes, serão apurados pelo Ministério Público Militar".
A operação desta sexta ocorre dois dias após o subcomandante da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Vila Kennedy, tenente Guilherme Lopes da Cruz, de 26 anos, ser morto em Jacarepaguá, na Zona Oeste
A operação desta sexta ocorre dois dias após o subcomandante da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Vila Kennedy, tenente Guilherme Lopes da Cruz, de 26 anos, ser morto em Jacarepaguá, na Zona Oeste
Militares tiram fotos de moradores de favelas do Rio e de seus documentos | Rio de Janeiro | G1
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