02/10/21 04:30
BRASÍLIA - Em junho de 2018, após uma consulta ginecológica, Yane Moreira da Silveira procurou uma delegacia no Distrito Federal para denunciar o médico Nicodemos Júnior Estanislau Morais por abuso. Ela também usou o Facebook para divulgar o caso, publicando o nome, fotos e o local de trabalho do médico. Com isso, da condição de vítima, ela também passou à de processada, uma vez que Nicodemos registrou queixa pelos crimes de calúnia, injúria e difamação. Nicodemos só foi preso esta semana em Anápolis (GO), cidade localizada entre Brasília e Goiânia, acusado de abusar outras mulheres.
Yane, que hoje tem 21 anos e ganha a vida vendendo bijuterias, conta que foi fazer um exame transvaginal, quando o abuso ocorreu. A jovem relata que, entre outras coisas, Nicodemos passou a mão nela e disse coisas inapropriadas. Na justiça, o processo movido por ela contra o médico andou até 2021, quando saiu uma sentença inocentando-o por falta de provas.
— Não deu em nada. Ele saiu inocentado, não foi preso, continuou atuando na área dele — diz Yane, que também reclama que a absolvição se deu por ela ser o lado mais fraco da história: — Eu tinha defensor público. Ele tinha advogado particular. Ele era médico. Eu apenas a paciente. Por ser o lado mais fraco, não me deram tanta credibilidade assim.
Yane afirma ter apagado a publicação que fez no Facebook poucos dias depois:
— Ao mesmo tempo em que tinha pessoas que estavam me dando apoio, tinha pessoas que estavam me ofendendo, dizendo que a culpa tinha sido minha, que eu tinha feito algo para que isso tivesse acontecido. Aí escutei falando que era para tirar porque ele poderia me processar. Acabei apagando, só que não resolveu nada, porque uma semana depois eu recebi uma ligação que ele tinha feito um boletim de ocorrência contra mim.
No processo por calúnia, difamação e injúria que o médico moveu contra Yane, ele pediu R$ 35 mil. A ação foi arquivada porque, no dia marcado para uma audiência de conciliação entre os dois, em novembro de 2019, Nicodemos não apareceu nem justificou a ausência. Yane lamenta ter retirado a postagem do ar:
— Se tivesse tido a coragem, não tivesse apagado, poderiam ter aparecido bem mais mulheres e evitado o que ele fez.
Sobre a sensação que teve ao saber da prisão de Nicodemos, afirma:
— Dá aquela sensação de alívio, mas ao mesmo tempo impotência, porque eu tentei reagir quando aconteceu, coloquei a cara dele na internet.
Veja também: Número de processos por importunação sexual explode desde a criação da lei em 2018
Yane conta que, após relatar o caso no Facebook, outras mulheres a procuraram para dizer que também tinham sofrido abuso.
— Elas disseram que também tinha acontecido com elas, que ele chegou a persegui-las. Quando eu tive que depor na delegacia, eu falei sobre isso com a delegada. Ela falou que tinha encontrado vítimas, mesmo de outros estados, mas elas não quiseram depor por se sentirem coagidas. Até então só eu tinha dado a cara a tapa para denunciar, mostrar o que tinha acontecido.
Yane pediu para não ter fotos suas publicadas nesta reportagem. O GLOBO não conseguiu localizar a advogada que defendeu o médico no processo contra a jovem.
Médico preso acusado de abusar de mulheres já processou jovem que o denunciou no Facebook
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