sábado, 14 de novembro de 2020

Sem privatizações e com pibinho, show do trilhão de Guedes vira rombo recorde

Plano do ministro da Economia era ambicioso e foi torpedeado pelas barganhas políticas e pela pandemia. Quem perde é justamente a parcela mais pobre da população, excluída da oportunidade de crescimento do país


 SÍLVIO RIBAS | BRASÍLIA

Durante a campanha eleitoral de 2018, Paulo Guedes, então superministro indicado, traçava planos ambiciosos para fazer uma expressiva mudança de rota na economia brasileira. A reorientação liberal – a mais explícita e profunda já proposta ao país – tinha entre os seus mantras um número redondo grande, muito grande: R$ 1 trilhão.

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Este seria o valor da economia para os cofres públicos proporcionada pela Reforma da Previdência em 10 anos. A gorda cifra também descrevia o saldo esperado com o pacote de privatizações, a ser usado na amortização da brutal e crescente dívida federal. Recentemente, Guedes indicou igual dimensão financeira para a venda de ativos imobiliários da União.

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Quase dois anos após as eleições presidenciais, esses trilhões do bem ainda não foram encaminhados e tiveram de ser adiados. Além de obstáculos políticos no Congresso Nacional, as boas intenções de austeridade e de restruturação patrimonial esbarraram em outro obstáculo ainda maior: a Covid-19.

A pandemia trouxe, desgraçadamente, novos e maus trilhões. O pior e mais óbvio deles é o rombo do governo federal de 2020. A Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão de monitoramento dos gastos públicos ligado ao Senado, estima um déficit primário de R$ 878 bilhões neste ano, sem contar o prolongamento do auxílio emergencial de R$ 600, que nesse montante representa um gasto mensal de R$ 50 bilhões.

Um horroroso número de doze zeros já pode encontrado no roll de medidas para combater o novo coronavírus e para socorrer os caixas de estados, municípios e empresas de todos os portes, contendo uma parte da inevitável onda de falências e demissões de trabalhadores.

Guedes é tão bom com números quanto com palavras. Como orador astuto e versátil, ele sabe sintetizar bem pensamentos em frases lapidares e slogans de mais fácil compreensão. Tal postura, adequada para estadistas, ajuda a galvanizar os ânimos combalidos de uma nação que há sete anos enfrenta crises geradas por desmandos na política e na economia.

Dos trilhões precisamos tirar mais esperança e força que dor e desalento. Mas o momento não ajuda. O Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil em 2019 foi de R$ 7,3 trilhões e deve recuar este ano para R$ 7 trilhões. Nesse meio tempo, o total de ativos dos bancos brasileiros já superara o PIB do país. Curiosamente, os brasileiros têm meio trilhão de reais aplicados no exterior legalmente declarado. Deve, na realidade, ser mais de um trilhão.

Para completar, o orçamento trilionário da União esboçado para 2021, de R$ 1,48 trilhão, é um cobertor curto nesse mar de dificuldades. Se o show do trilhão proposto por Paulo Guedes tivesse sido encenado em 2019, o meteoro que atingiu a economia brasileira este ano representaria uma dura pausa para a retomada previamente contratada para o ano seguinte.

Vender e cortar trilhões inúteis para investir trilhões utilíssimos no povo e na prosperidade. Trata-se aí de uma equação tão simples de entender quanto difícil de se realizar. É preciso Guedes e o Brasil voltarem a recitar o mantra dos trilhões, os bons e urgentes trilhões.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.

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