Segundo bombeiros, vizinho colocou fogo em pedaços de madeira, mas chamas se espalharam e atingiram casas; não havia ninguém nas residências no momento.
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Criado: Segunda, 11 Novembro 2019 13:33
O caso do suicídio do cabo da Polícia Militar de Minas Gerais, Leandro Cardoso Novais, ocorrido no último dia 15, será levado à Justiça, para que seja apurada a conduta institucional da corporação. Essa foi uma das ações anunciadas pelo deputado Sargento Rodrigues ao final da reunião da Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa, a qual preside, realizada nesta quinta-feira (07/11), para apurar os fatos que antecederam o ato. Um dos objetivos da ação é provocar o enfrentamento das consequências irreversíveis que alguns procedimentos administrativos podem causar ao policial.
“Em pouco mais de um mês, é a segunda vez que a comissão se
reúne para tratar do mesmo tema. Estamos enfrentando um aumento de casos de
autoextermínio entre servidores da segurança pública e as instituições precisam
tratar as causas, com urgência. Está claro e notório que o estresse inerente à
profissão agrava a situação de risco, mas, muitas vezes, o gatilho está no
assédio moral, na punição injusta e excessiva, na perseguição que existe por
trás de atos e decisões de quem possui o poder da caneta”, ressaltou o
deputado, que também irá propor alterações na legislação.
O primeiro depoimento ouvido pela comissão foi o da viúva do
cabo Leandro, Denísia Barreiro da Costa Novais. Muito emocionada, relatou todas
as dificuldades que antecederam o falecimento do marido, com quem tem dois
filhos pequenos. Segundo ela, todo o atordoamento começou após ele ser
transferido de Teófilo Otoni, onde residiam, para Araçuaí, a mais de 200 km de
distância da família. O ato foi a segunda punição aplicada ao militar em razão
de um procedimento administrativo apuratório, ao qual foi submetido sob a
acusação de fazer “bico” para complementar a renda familiar. Ele já havia
perdido pontos em sua ficha funcional e sido suspenso por três dias das
atividades, com consequente desconto no vencimento. A transferência para a 14ª
Cia Independente aconteceu por ordem do coronel Sérvio Túlio Mariano Salazar,
então comandante da 15ª RPM, que, ao assumir o posto, pediu a reabertura do
caso.
Segundo Denísia Novais, desde então o marido começou a
apresentar quadro severo de depressão e a manifestar a intenção de tirar a vida
de terceiros e também a própria. Várias foram as tentativas para reverter a
situação no âmbito administrativo, mas não obtiveram sucesso. Ela afirma que
Leandro chegou a ser ameaçado com transferência para uma unidade ainda mais
longe de Teófilo Otoni que Araçuaí, se continuasse insistindo. Diante disso,
decidiram acionar a justiça, mas não houve tempo para aguardar a decisão. “Ele
não conseguiu esperar. Em ato de total desespero, tirou a própria vida e nos
deixou um vazio sem fim”, relatou a irmã do militar, Débora Cardoso Novais. Ela
reafirmou os fatos narrados pela cunhada e lembrou a última foto que recebeu do
irmão, na qual ele estava irreconhecível, definhando em meio a tanta tristeza,
num quadro explícito de extremo sofrimento, descrito em laudo psiquiátrico lido
por ela.
Denísia resgatou o histórico de consultas, laudos, exames,
indicações de tratamentos psicológico e psiquiátrico e internação de Leandro.
“Ainda assim, ele chegou a ter atestados médicos indeferidos pela PM e
constantemente eram feitas insinuações de que estava era querendo ‘dar o
chapéu’. Tudo isso foi agravando o quadro dele, pois, além de estar
extremamente infeliz longe da família, ainda se sentia injustiçado e perseguido
pela corporação”, relatou.
Em razão de um dos últimos episódios de surto que Leandro
apresentou ao chegar em casa, Denísia conta que o levou ao atendimento
psiquiátrico e que recebeu encaminhamento médico para internação e afastamento
do trabalho por 30 dias. “Esse foi um dos atestados recusados pela PM, que não
foi homologado. Nesse dia, Leandro voltou para a casa transtornado. Eu procurei
a Tenente Sumara Sucupira de Aguilar, perita do 44º Batalhão de Polícia
Militar, para pedir ajuda, porque estava desesperada. Ela me respondeu
friamente que o caso do Leandro não era grave e que eu não tinha ideia do que
era ter problemas psiquiátricos, sugerindo que, já que eu queria interná-lo, a
melhor alternativa era levá-lo de ônibus até Belo Horizonte e depois pegar
outro para Divinópolis, onde ficava a clínica”, relatou Denísia.
O recibo assinado por Leandro após receber de volta a
pistola .40 e munição que haviam sido recolhidos durante seis meses, quando
esteve dispensado de armamento e afastado do serviço operacional pela Junta
Central de Saúde, foi apresentado pela viúva como o atestado de óbito precoce
de Leandro. “Depois de todos esses episódios, a PM devolveu a ele a arma que,
dias depois, usou para tirar a própria vida. Ele não aguentava mais, estava
exaurido, e me avisou que, se a polícia não acreditava nele, e nem mesmo nos
atestados, ele ia fazer o que eles queriam na consulta com a junta médica. Ia dizer
a eles que estava bem e pronto para voltar à ativa. Implorei para que não
fizesse isso, mas não adiantou. Olharam para a ‘capa’ que ele vestia e se
esqueceram do interior. Deram a ele ordem para trabalhar e o final,
infelizmente, todos nós sabemos qual foi”.
OFICIAIS PM
O coronel Sérvio Túlio Mariano Salazar, então comandante da
15ª RPM, e responsável pela transferência de Leandro Novais para Araçuaí,
explicou aos deputados que, ao assumir o comando da região, foi relatado sobre
o caso. Ao verificar o procedimento, constatou a gravidade dos fatos e
determinou a transferência do policial. Como justificativa, citou um memorando
da Polícia Militar, que traz orientações específicas para casos como esse,
determinando a movimentação como forma de punição o que, segundo ele, não se
deu exclusivamente em razão de “bico”. Afirmou que desvios mais graves haviam
sido cometidos, mas não esclareceu quais seriam. Ele esclareceu que, ao tomar
conhecimento do quadro de saúde do militar, o encaminhou para atendimento na
Clínica de Psiquiatria e Psicologia da Polícia Militar – Clips, e que nunca foi
procurado pela família para tratar da transferência.
Desde fevereiro deste ano, o comando da 14ª Cia. PM
Independente, na qual o cabo Leandro estava lotado, foi assumido pelo major
Rafael Duarte Muniz. Ele relatou ter acompanhado de perto a situação do
policial e que, sempre que foi por ele procurado, tentou facilitar seu acesso
ao tratamento e também as visitas à família em Teófilo Otoni, o colocando nas
melhores escalas, liberando para consultas e exames e o afastando do serviço de
viatura, quando foi por ele solicitado, em razão de efeitos colaterais da
medicação que estava usando. O oficial negou ter conhecimento de qualquer
perseguição contra o cabo.
Sobre o retorno do militar ao serviço operacional e
consequente liberação de armamento, o major relatou que, na data de 9 de
setembro último, recebeu parecer da JCS, atestando que o policial estava apto
voltar às atividades. Segundo ele, o próprio Leandro afirmou ao seu superior
imediato estar pronto para o serviço e que o pior já tinha passado. “Não aceito
ser corresponsabilizado pela morte do Leandro. Tenho a consciência tranquila e
sei que fiz tudo que eu podia para ajudá-lo”.
Questionado pelo deputado Sargento Rodrigues sobre oficiais
subordinados que faziam “bico” na região e sobre reclamações da tropa sobre
perseguições, Muniz negou ter recebido denúncias. O deputado, então, relatou
serem várias as denúncias de que o Tenente Fabiano Marinho, subcomandante da
14ª Cia. PM Independente, à qual Leandro pertencia, persegue e assedia
moralmente seus subordinados. Além disso, mantém uma empresa em nome da esposa
e que, constantemente, se desloca até lá durante o serviço para auxiliá-la.
“Tenho fotos e documentos embasando as denúncias sobre a empresa e diversos
relatos sobre perseguições, assédio moral, ameças. Inclusive, fiz questão de
convocá-lo para esta audiência, para que pudesse nos responder sobre essas
acusações. Se o Major Muniz não tinha conhecimento sobre a denúncias contra seu
subcomandante, agora tem. Já foram encaminhadas ao comandante-geral e espero
serem devidamente apuradas, com rigor.”, afirmou o deputado. Neste momento, a
viúva revelou ser o Tenente Marinho a pessoa em quem Leandro ameaçava dar um
tiro na cabeça, pois não suportava mais ser perseguido e humilhado por ele, que
era seu superior direto, o que também foi confirmado pela irmã do militar.
Ao ser ouvido pela comissão, o tenente Fabiano Marinho, que
também é o oficial do serviço de inteligência do comandante, negou que a esposa
seja proprietária da referida empresa e alegou que costuma ser alvo constante
de denúncias, em razão da sua atuação como P2. Ele negou ter perseguido o Cabo
Leandro, alegando ser ele seu melhor amigo, com quem tinha uma relação próxima.
Em sua fala, chegou a dizer que estava sofrendo mais que a família com a morte
do companheiro.
Também esteve presente à reunião a tenente Sumara Sucupira
de Aguilar, médica perita do 44º Batalhão de Polícia Militar, que foi citada
por Denísia, no caso da não homologação dos atestados e também pelo descaso
sobre as condições psiquiátricas dele. Muito nervosa, negou as acusações e
afirmou ter tomado todas as providências que lhe eram cabíveis, sempre que foi
necessário, pois tinha consciência de que o caso dele era complexo e que exigia
tratamento especializado. Sargento Rodrigues relatou que chegaram ao seu
conhecimento várias reclamações de que a oficial é arrogante no trato com os
militares e que, constantemente, nega os atestados que lhe são apresentados.
Ele também questionou a forma utilizada para redigir os relatórios sobre o
Leandro, com expressões como “transferido a bem da disciplina”, dentre outras.
Entre lágrimas, a oficial disse que cumpriu sua obrigação profissional e ética
e admitiu a pressão existente dentro dos quartéis.
CONVIDADOS
Cristiane Santos, psicóloga e conselheira do Conselho
Regional de Pscologia, após ouvir todos os relatos, afirmou não ter dúvida de
que a lógica institucional da PM sobre procedimentos e condutas de saúde
precisa ser questionada. “A necessidade de validação por um militar, de um
laudo ou perícia emitida por um profissional credenciado para tal, gera um
embaraço ético, além de outros questionamentos possíveis. Esse procedimento
precisa ser repensado. Policial não é super-herói! Ele é humano; adoece e entra
em sofrimento”, afirmou.
Representando a corporação, a Tenente psicóloga Joyce Lima
Carvalho de Paula, falou sobre as mudanças que estão ocorrendo visando melhor
apoio à saúde emocional dos militares e de seus dependentes. Atualmente, são 47
psicólogos em todo o Estado, mas está sendo elaborado um levantamento de todos
os profissionais da rede orgânica e credenciados para, em parceria com o IPSM,
ampliar o atendimento. Ela ressaltou a importância de atuar no campo da
prevenção, além de manter uma rede de apoio e acompanhamento em casos de
estresse pós-traumático.
As entidades de classe dos servidores da segurança pública,
ASPRA, CSCS e ASCOBOM, estiveram presentes e reforçaram as denúncias e
questionamentos em relação aos critérios das punições administrativas. Todos
manifestaram a necessidade de se criar, ao menos, critérios para as
transferências. O presidente do Centro Social dos Cabos e Soldados, cabo
Coelho, sugeriu que a transferência do policial em relação à sua residência
seja para uma unidade localizada a um limite entre 50 e 60 km, ideia apoiada e reforçada
pelo deputado Sargento Rodrigues.
DESDOBRAMENTOS DA AUDIÊNCIA
Além de levar o caso à justiça, tanto na esfera
administrativa quanto cível, o deputado Sargento Rodrigues anunciou que irão
propor alterações na legislação. Para ele, ficou evidente a necessidade de se
revisar as diretrizes internas da PM, de forma a sanar práticas abusivas, que
levam ao adoecimento dos policiais e seus familiares. Dentre as críticas, está
o poder concedido pelo Código de Ética aos comandantes para transferir, punitivamente,
seus subordinados da maneira que lhe convier, sem que sejam observados e
respeitados conceitos básicos envolvendo a família. “Até mesmo os presos têm
assegurado, pelo Código Penal, o direito a cumprir pena próximo aos seus
familiares, além de ser vetada a dupla punição pelo mesmo crime. Hoje, tivemos
um exemplo de que esses dois direitos podem ser violados, quando envolve
militares. O cabo Leandro foi punido duas vezes e afastado 230km da sua
família”, exemplificou o deputado, afirmando que o gatilho para o suicídio do
policial foi a sua transferência e o sentimento de injustiça. “Claro que outros
motivos podem ter contribuído para isso, mas, não há dúvida de que a situação
se agravou em razão dos últimos acontecimentos”.
A sugestão trazida pela representante do Conselho Regional
de Psicologia, reforçada pela representante da PM, para se discutir o tema e
apresentar aos deputados sugestões, foi prontamente recebida pelo presidente da
Comissão, que ressaltou que a integridade física e moral é direito do policial
e precisa ser assegurada pela corporação. “O apoio dos profissionais da saúde
será fundamental para tratarmos a atual realidade de adoecimento emocional que
tem acometido os profissionais da área de segurança”, afirmou Sargento
Rodrigues.
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