O juiz Mario Carroza determinou a sentença 33 anos depois do ataque que matou Rodrigo Rojas de Negri e deixou Carmen Gloria Quintana gravemente ferida
Nesta semana, o juiz extraordinário para causas de violações aos direitos humanos, Mario Carroza, condenou 11 militares reformados do Exército chileno por sua responsabilidade nos delitos de homicídio qualificado de Rodrigo Andrés Rojas de Negri e homicídio frustrado contra Carmen Gloria Quintana Arancibia.
O crime – um ataque incendiário cometido pelos policiais contra estudantes que se mobilizavam contra a ditadura – aconteceu no dia 2 de julho de 1986, na região de Estación Central, em Santiago, e ficou conhecido no Chile como Caso Queimados.
Segundo o documento da sentença, os ex-militares Julio Ernesto Castañer González, Iván Humberto Figueroa Canobra e Nelson Fidel Medina Gálvez foram condenados a 10 anos e um dia de presídio, como autores materiais dos delitos. Também houve pena para Luis Alberto Zúñiga González, Jorge Osvaldo Astorga Espinoza, Francisco Fernando Vásquez Vergara, Leonardo Antonio Riquelme Alarcón, Walter Ronny Lara Gutiérrez, Juan Ramón González Carrasco, Pedro Patricio Franco Rivas e Sergio Hernández Ávila, apontados como cúmplices, que terão de cumprir 3 anos e um dia de presídio, com a possibilidade de obter o benefício de liberdade condicional.
Ademais, se decretou a absolvição de René Aníbal Muñoz Bruce, por falta provas da sua participação, e de Pedro Fernández Dittus, pela aplicação de prescrição excepcionalmente no seu caso.
Carta da vítima
Após divulgada a decisão, a ativista Carmen Gloria Quintana, vítima que sobreviveu ao ataque incendiário, publicou uma carta onde falou sobre os condenados e criticou a forma como o caso foi tratado.
Após 32 anos, Quintana conta que recebe a sentença com “sentimentos encontrados”. Por uma parte, “com alegria ao saber que finalmente se estabelece a verdade oficial que desde as testemunhas declararam desde o começo, situação que a ditadura e a direita chilena tentaram ocultar e distorcer. Agora, ninguém pode negar a evidência”, indica.
“Esta é A VERDADE que ficará guardada na história: dois jovens que lutavam pela democracia foram queimados vivos por militares durante a ditadura civil-militar de Pinochet. Rodrigo Rojas faleceu com 65% do seu corpo queimado, e eu sobrevivi com 62% do meu corpo queimado”, agrega.
Entretanto, ela acredita que tardou muito tempo em se chegar a essa condenação, e que “nada poderá reparar o meu sofrimento e o de minha família durante anos, o longo e doloroso tratamento médico que significou mais de 40 operações, sessões de reabilitação física e psicológica, as consequências na vida pessoal, aceitar a desfiguração do meu corpo e tentar reconstruir minha vida aos 18 anos depois de passar por tudo isso”.
A ativista agrega que também há uma “parte moral familiar, quando fomos perseguidos, por denunciar o caso, minha irmã foi presa por ser testemunha, fomos ameaçadas de morte, tivemos que ir ao exílio, reconstruímos a vida familiar em outro país, com o custo emocional que significou para todos, pais separados, família dispersa entre Chile e Canadá, avós que não puderam ver seus netos crescerem”.
Sobre as sentenças, considera que “os militares foram condenados a penas baixas, considerando o horror que cometeram: eles queimaram vivas duas pessoas. Não sei o que acontecerá agora, se cumprirão suas penas até o final. Depois de 32 anos de impunidade, creio que posso questionar a importância de que a justiça chegue a tempo, e faço um apelo à reflexão para os juízes, para que pensem na impunidade biológica, no fato de que muitas pessoas vítimas da ditadura e familiares de desaparecidos tenham morrido sem ter uma resposta, sem a verdade, sem justiça e sem saber ainda aonde estão os restos dos seus seres queridos”.
Nesse sentido, Quintana questiona se realmente existe separação de poderes do Estado no Chile. “Os militares ainda estão protegidos, e não somente ocultam a informação das violações aos direitos humanos aos tribunais, aos poderes Executivo e Legislativo. Por outra parte, os partidos políticos também são responsáveis pelos pactos de impunidade, pelo negacionismo, pela instalação do segredo de 50 anos que pesa sobre o Informe Valech (segunda Comissão da Verdade realizada no país, entre 2003 e 2004), pelos pactos de silêncio dentro das Forças Armadas, que eles sabem que existem e toleram esta situação”, expressou.
“Só espero que esta dura experiência de viver em ditadura, nunca mais se repita no Chile, e para isso devemos construir uma verdadeira democracia. Acelerar os processos ainda pendentes, estabelecer a verdade, a justiça e fazer todos os esforços para encontrar os desaparecidos”, finaliza.
*Com informações dos seguintes textos do "El Desconcierto":
https://www.eldesconcierto.cl/2019/03/21/caso-quemados-once-ex-militares-fueron-condenados-por-homicidio-calificado1/
https://www.eldesconcierto.cl/2019/03/22/la-emotiva-carta-de-carmen-gloria-quintana-tras-condenas-por-caso-quemados-nada-podra-reparar-el-dano/
O crime – um ataque incendiário cometido pelos policiais contra estudantes que se mobilizavam contra a ditadura – aconteceu no dia 2 de julho de 1986, na região de Estación Central, em Santiago, e ficou conhecido no Chile como Caso Queimados.
Segundo o documento da sentença, os ex-militares Julio Ernesto Castañer González, Iván Humberto Figueroa Canobra e Nelson Fidel Medina Gálvez foram condenados a 10 anos e um dia de presídio, como autores materiais dos delitos. Também houve pena para Luis Alberto Zúñiga González, Jorge Osvaldo Astorga Espinoza, Francisco Fernando Vásquez Vergara, Leonardo Antonio Riquelme Alarcón, Walter Ronny Lara Gutiérrez, Juan Ramón González Carrasco, Pedro Patricio Franco Rivas e Sergio Hernández Ávila, apontados como cúmplices, que terão de cumprir 3 anos e um dia de presídio, com a possibilidade de obter o benefício de liberdade condicional.
Ademais, se decretou a absolvição de René Aníbal Muñoz Bruce, por falta provas da sua participação, e de Pedro Fernández Dittus, pela aplicação de prescrição excepcionalmente no seu caso.
Carta da vítima
Após divulgada a decisão, a ativista Carmen Gloria Quintana, vítima que sobreviveu ao ataque incendiário, publicou uma carta onde falou sobre os condenados e criticou a forma como o caso foi tratado.
Após 32 anos, Quintana conta que recebe a sentença com “sentimentos encontrados”. Por uma parte, “com alegria ao saber que finalmente se estabelece a verdade oficial que desde as testemunhas declararam desde o começo, situação que a ditadura e a direita chilena tentaram ocultar e distorcer. Agora, ninguém pode negar a evidência”, indica.
“Esta é A VERDADE que ficará guardada na história: dois jovens que lutavam pela democracia foram queimados vivos por militares durante a ditadura civil-militar de Pinochet. Rodrigo Rojas faleceu com 65% do seu corpo queimado, e eu sobrevivi com 62% do meu corpo queimado”, agrega.
Entretanto, ela acredita que tardou muito tempo em se chegar a essa condenação, e que “nada poderá reparar o meu sofrimento e o de minha família durante anos, o longo e doloroso tratamento médico que significou mais de 40 operações, sessões de reabilitação física e psicológica, as consequências na vida pessoal, aceitar a desfiguração do meu corpo e tentar reconstruir minha vida aos 18 anos depois de passar por tudo isso”.
A ativista agrega que também há uma “parte moral familiar, quando fomos perseguidos, por denunciar o caso, minha irmã foi presa por ser testemunha, fomos ameaçadas de morte, tivemos que ir ao exílio, reconstruímos a vida familiar em outro país, com o custo emocional que significou para todos, pais separados, família dispersa entre Chile e Canadá, avós que não puderam ver seus netos crescerem”.
Sobre as sentenças, considera que “os militares foram condenados a penas baixas, considerando o horror que cometeram: eles queimaram vivas duas pessoas. Não sei o que acontecerá agora, se cumprirão suas penas até o final. Depois de 32 anos de impunidade, creio que posso questionar a importância de que a justiça chegue a tempo, e faço um apelo à reflexão para os juízes, para que pensem na impunidade biológica, no fato de que muitas pessoas vítimas da ditadura e familiares de desaparecidos tenham morrido sem ter uma resposta, sem a verdade, sem justiça e sem saber ainda aonde estão os restos dos seus seres queridos”.
Nesse sentido, Quintana questiona se realmente existe separação de poderes do Estado no Chile. “Os militares ainda estão protegidos, e não somente ocultam a informação das violações aos direitos humanos aos tribunais, aos poderes Executivo e Legislativo. Por outra parte, os partidos políticos também são responsáveis pelos pactos de impunidade, pelo negacionismo, pela instalação do segredo de 50 anos que pesa sobre o Informe Valech (segunda Comissão da Verdade realizada no país, entre 2003 e 2004), pelos pactos de silêncio dentro das Forças Armadas, que eles sabem que existem e toleram esta situação”, expressou.
“Só espero que esta dura experiência de viver em ditadura, nunca mais se repita no Chile, e para isso devemos construir uma verdadeira democracia. Acelerar os processos ainda pendentes, estabelecer a verdade, a justiça e fazer todos os esforços para encontrar os desaparecidos”, finaliza.
*Com informações dos seguintes textos do "El Desconcierto":
https://www.eldesconcierto.cl/2019/03/21/caso-quemados-once-ex-militares-fueron-condenados-por-homicidio-calificado1/
https://www.eldesconcierto.cl/2019/03/22/la-emotiva-carta-de-carmen-gloria-quintana-tras-condenas-por-caso-quemados-nada-podra-reparar-el-dano/
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