Em entrevista à CNN nesta quarta-feira (22), o diretor-presidente da Anvisa, Antônio Barra Torres explicou o processo e deu detalhes como será produzida a vacina de Oxford, que já recebeu recursos do governo federal.
“Vacina de Oxford irá trabalhar com insumos farmacêutico vindo da China. O insumo farmacêutico é a farinha que faz o pão, ele é a base da vacina, um substrato básico. Hoje, no mundo, é quase impossível ter um produto feito 100% em um país, essa noção pertence ao passado.”
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Torres também falou sobre a expectativa da liberação de uma vacina para uso em massa na população. Ressaltou que há no Brasil, atualmente, quatro medicamentos contra a Covid-19 sendo desenvolvidos, mas que não se pode fazer previsão de datas nas quais estarão prontos.
“Todos esperam uma resposta sobre as vacinas no menor tempo possível, porém precisamos analisar as questões de segurança e eficácia. Depois dessas verificações, teremos no registro a análise da qualidade do produto e as certificações necessárias para seu uso em massa,” disse o presidente-diretor da Anvisa.
“Mesmo depois do registro, o trabalho da agência não vai parar. Vamos monitorar as etapas da vacinação. É um processo de médio e longo prazo, então não falamos em data.”
Impasse
O presidente Jair Bolsonaro afirmou à CNN na noite dessa quarta-feira (21) que o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, não vai sair da pasta e que o governo federal não vai recuar da decisão sobre a compra da vacina chinesa Coronavac.
"O ministro Pazuello não vai sair do governo. O que aconteceu foi um mal-entendido, mas isso não vai envenenar o nosso ambiente. Pazuello é meu amigo particular e ele é um dos melhores ministros da Saúde que o Brasil já teve", ressaltou.
A declaração se deu após um dia de intensa discussão em reflexo de mensagens publicadas no perfil que o presidente mantém no Facebook.
“Para o meu Governo, qualquer vacina, antes de ser disponibilizada à população, deverá ser COMPROVADA CIENTIFICAMENTE PELO MINISTÉRIO DA SAÚDE e CERTIFICADA PELA ANVISA”, escreveu Bolsonaro, se referindo à Coronavac como “a vacina chinesa de João Doria”.
O presidente afirmou ainda que a população brasileira “NÃO SERÁ COBAIA DE NINGUÉM”. “Não se justifica um bilionário aporte financeiro num medicamento que sequer ultrapassou sua fase de testagem. Diante do exposto, minha decisão é a de não adquirir a referida vacina”, concluiu.
Pouco antes, em comentários a internautas em outra publicação na mesma rede social, Bolsonaro já havia dito que a vacina “não será comprada” pelo governo, revertendo anúncio feito na véspera pelo ministro da Saúde, Eduardo Pazuello.
Na terça-feira (20), após reunião com governadores, o Ministério da Saúde chegou a definir a compra de 46 milhões de doses da Coronavac, o que faria o país chegar a um total de 188 milhões de doses de imunizantes contra a Covid-19 já adquiridos.
Apesar de usar os argumentos financeiro e de comprovação científica para rejeitar a aquisição da Coronavac, o governo federal assinou em agosto uma Medida Provisória que liberou R$ 1,9 bilhão para a produção e aquisição de 100 milhões de doses da vacina do laboratório AstraZeneca e da Universidade de Oxford contra a Covid-19, produto que também ainda não tem comprovação científica de eficácia.
Tanto o imunizante da AstraZeneca quanto a Coronavac estão na fase 3 de testes clínicos. Enquanto a vacina inglesa é testada no Brasil em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o imunizante chinês é testado em parceria com o Butantan.
Ao longo da quarta-feira, a atitude do presidente Jair Bolsonaro gerou críticas de governadores de vários estados, que se diziam otimistas com a reunião de terça – na qual o Ministério da Saúde se comprometeu a financiar doses da Coronavac – e preocupados após as declarações do presidente da República na quarta.
Em entrevista à CNN, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), afirmou que os governantes vão "buscar todos os caminhos", o que inclui o Congresso e o Poder Judiciário, para que seja disponibilizada uma vacina contra a Covid-19 quanto antes for possível.
Segundo o governador, há expectativa de que a Coronavac esteja disponível até um mês antes que a da Universidade de Oxford com a AstraZeneca. Para Eduardo Leite, não se pode haver "preconceito" com a origem da vacina, desde que esta seja aprovada pela Anvisa.
"Boa parte das vacinas que são aplicadas já são produzidas na China, assim como muitos produtos que nós consumimos", disse Leite, entrevistado pelas âncoras Daniela Lima e Roberta Russo. "Esse preconceito em relação à origem da vacina não faz nenhum sentido", criticou.
O governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), afirmou que embate entre governo federal e o estado de São Paulo sobre a Coronavac pode atrasar a retomada no país.
O político afirma ainda que seu medo é que "questões políticas e ideológicas" atrapalhem a imunização dos brasileiros.
"Se a questão da imunização não tiver a coordenação do governo federal, isso pode entrar em uma disputa entre estados. Mas ela está submetida à aprovação pela Anvisa. Meu medo é de que outros países comecem a vacinar mais rapidamente, e o Brasil, por questões ideológicas e políticas, não comece a vacinar, e que a gente demore na nossa retomada. Além disso, podemos perder muitas vidas que poderiam ser salvas em um momento como este", explica
Também em entrevista à CNN, o governador do Piauí, Wellington Dias (PT), afirmou que uma vacina contra a Covid-19, que tenha eficácia comprovada cientificamente, é "bem-vinda ao povo brasileiro", independentemente do país de origem.
Dias comentou o impasse sobre a Coronavac, da empresa chinesa Sinovac, e defendeu a produção brasileira, que será feita em parceria com o Instituto Butantan em São Paulo.
"Não estamos importando de nenhum país. Até porque o Brasil tem uma expertise nesta área, e é o Butantan e a Fiocruz que vão ter essa responsabilidade de, com muito critério, oferecer o melhor para o povo brasileiro. É uma vacina produzida no Brasil, mas se fosse de outro lugar também seria bem-vinda para o povo brasileiro, desde que aprovada cientificamente", afirmou o governador.
Dias classificou que a reunião com o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, foi animadora. "Porque saímos dali não apenas com esperança, mas com estimativa", justificou.
"É verdade que ainda não há data definida, mas ficou claro que o Butantan teria condições de entregar, ainda em dezembro, mais ou menos 46 milhões de doses e seria possível se trabalhar no mês de janeiro", avaliou. "Nós acreditamos na ciência, e a conversa ontem foi muito boa", completou.
Para ele, deixar para depois a decisão sobre a vacina pode significar perda de mais vidas. Dias defendeu que o Brasil não pode ficar esperando e acumulando mais mortes enquanto o mundo inteiro estiver vacinando a população.
"Trinta dias que a gente perde estamos perdendo 18 mil ou 20 mil vidas humanas. Faz uma diferença. Por isso, qualquer que seja vacina – seja americana, chinesa, russa, do Reino Unido e de qualquer lugar – que fique pronta e autorizada, deve ser imediatamente colocada à disposição dos brasileiros", defendeu o governador do Piauí.
No final da quarta-feira, em entrevista coletiva, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), afirmou que aguardará até sexta-feira (23) um possível recuo do governo federal a respeito da vacina Coronavac.
Caso o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) não restabeleça o acordo para a compra de 46 milhões de doses do imunizante, diz Doria, ele e os demais governadores de estados adotarão as medidas necessárias para garantir o fornecimento da vacina, testada pelo Instituto Butantan em parceria com a farmacêutica chinesa Sinovac.
"Vamos esperar 48 horas. Se até sexta-feira, não houver nenhuma medida de recuo por parte do governo federal para fazer o que deve fazer, apoiar as vacinas, inclusive a do Butantan, nós sabemos quais medidas poderão ser adotadas. Seja por São Paulo, seja pelos governadores, que estão entristecidos, para não dizer frustrados", disse.
João Doria afirmou que os governadores estão "entristecidos, para não dizer frustrados" e afirmou que Bolsonaro desrespeitou o Pacto Federativo, a divisão de poder entre União, estados e municípios, ao desautorizar a reunião entre o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, e representantes de 24 estados.
"O presidente desvalidou uma reunião do ministro da saúde com 24 governadores. Além de desautorizar o seu ministro da Saúde, ele desautorizou o pacto federativo. Todos os governadores querem a vacina, para salvar a população dos seus estados", disse Doria à imprensa.
Para o governador paulista, o Brasil deve buscar "as vacinas", no plural, para poder imunizar o maior número de pessoas.
"Com a vacina, salvamos vidas, controlamos o coronavírus, a pandemia, e voltaremos à normalidade da economia, da geração de empregos e da geração de renda", disse João Doria.
(Edição: Sinara Peixoto)
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