Pressão sobre política da Petrobras cresce após forte aumento dos combustíveis. Valor do litro na bomba é o mais alto em quase duas décadas, mas peso no salário mínimo já foi maior
FUNCIONÁRIO DE POSTO DE GASOLINA ATUALIZA PREÇOS EM CURITIBA
A forte alta anunciada pela Petrobras em 10 de março de 2022 fez com que as discussões sobre os preços dos combustíveis no Brasil voltassem ao centro do debate público. O presidente Jair Bolsonaro critica a política de preços da estatal, mas tenta se distanciar de seus efeitos, dizendo nada ter a fazer. Enquanto isso, integrantes do governo põem pressão nos bastidores sobre o presidente da empresa de petróleo, o general da reserva Joaquim Silva e Luna.
Os aumentos recebem críticas da oposição, incluindo pré-candidatos à Presidência da República como Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Ciro Gomes (PDT) e Sergio Moro (Podemos).
Neste texto, o Nexo mostra como o novo aumento anunciado pela Petrobras se insere na trajetória dos últimos 20 anos de preços da gasolina no Brasil.
O preço da gasolina
Em termos nominais – ou seja, que não consideram a inflação –, a gasolina ficou excessivamente mais cara no final de 2021 e nos primeiros meses de 2022. Na média, o preço final ao consumidor chegou a R$ 6,75 por litro de gasolina em novembro de 2021, segundo a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis).
O dado mais recente da série histórica da ANP é de 5 de março de 2022, com o litro da gasolina custando em média R$ 6,577. O dado é anterior, portanto, ao novo ajuste anunciado pela Petrobras. A tendência é que a alta de 18,8% da gasolina vendida nas refinarias da estatal leve a um novo recorde do preço nominal do combustível na bomba.
ALTA NA BOMBA
Quando se considera e corrige os efeitos da inflação, o pico do preço continua sendo a virada de 2021 para 2022. Mas a distância para outros momentos desde 2004 – quando se inicia a série da ANP – fica consideravelmente menor.
COM CORREÇÃO
Trazendo para preços de 2022 – um cálculo que permite uma comparação melhor entre períodos –, o litro da gasolina em março de 2006, por exemplo, custava cerca de R$ 6,25. Em novembro de 2021, bateu R$ 6,94. Alguns postos vendiam gasolina a quase R$ 8,00 nesta quinta (17).
Na série histórica iniciada em 2004, o valor real mais barato da gasolina ocorreu em maio de 2020, quando o preço médio do litro ficou em R$ 4,39 (em valores de 2022). Naquele momento, a Petrobras havia reduzido os preços praticados nas refinarias. O petróleo estava em queda no mercado internacional por causa da pandemia e covid-19 e do crash de março de 2020, ligado a uma disputa entre Arábia Saudita e Rússia.
A gasolina e o salário mínimo
A correção pela inflação é uma das formas de olhar de forma mais precisa para o preço da gasolina. Mas não é a única. É possível também comparar o peso da gasolina na renda dos brasileiros.
No gráfico abaixo, o Nexo mostra o custo de encher um tanque de 50 litros de gasolina em relação ao salário mínimo. Embora o custo já tenha sido maior, ele está em alta desde meados de 2020.
EM ALTA
O movimento descrito no gráfico depende das trajetórias de duas variáveis: o preço da gasolina e o valor do salário mínimo. Entre 2004 e o final de 2014, o valor do litro de gasolina teve pouca variação, ficando na faixa entre R$ 2 e R$ 3 em termos nominais – o que se deve em boa parte às políticas de intervenção sobre o preço, adotadas pelos governos do PT. Mas nesse mesmo período, a renda do brasileiro teve alta, assim como o salário mínimo. Por isso, a gasolina diminuiu seu peso em relação ao salário mínimo.
A comparação entre preço da gasolina e salário mínimo feita com ou sem a correção da inflação chega ao mesmo resultado.
O peso do preço da gasolina aumentou a partir da segunda metade da década de 2010, quando o salário mínimo praticamente estagnou, ao mesmo tempo que o combustível teve momentos relevantes de avanço. Em 2022, a renda do brasileiro está em baixa, enquanto o combustível chega a seus níveis mais altos.
O preço do barril de petróleo
A Petrobras adota desde 2016 uma política pela qual o preço dos combustíveis no Brasil é pautado pela cotação do barril de petróleo no mercado internacional – em dólar. A alta do barril e do dólar têm sido justamente as causas do aumento de preços de combustíveis no Brasil em 2021 e 2022.
Em março de 2022, o barril de petróleo atingiu o maior preço em dólar (sem correção pela inflação) desde 2008. O principal motivo para isso é a guerra na Ucrânia, que compromete a capacidade de produção e distribuição da Rússia, uma das maiores exportadoras de petróleo do mundo.
Por causa do efeito do câmbio, um mesmo preço do barril em dólar pode ter valor diferente em reais a depender da cotação da moeda americana no Brasil. Se o barril, por exemplo, custa US$ 100 em um momento em que o dólar está em R$ 3,00, o valor em reais do Brasil é de R$ 300. Mas se o câmbio pula para R$ 5,00, o barril salta a R$ 500.
O preço do barril em reais também pode ser corrigido pela inflação. Esse recorte mostra que, mesmo fazendo o ajuste, o preço do petróleo em reais em 2022 é o mais alto em 20 anos. O pico anterior foi justamente em julho de 2008, pouco antes da eclosão da crise financeira global. É o que mostra o gráfico abaixo.
PICO
Ou seja, a Petrobras mantém em 2022 uma política de preços que acompanha os movimentos internacionais do barril justamente no momento em que o petróleo está no nível mais alto (em reais) nos últimos 20 anos.
Os caminhos de gasolina e petróleo
Antes de 2016, sob os governos petistas, a Petrobras não necessariamente acompanhava o mercado internacional de petróleo ao definir o preço de combustíveis.
No governo Lula (2003-2010), por exemplo, a gasolina chegou a ficar 31 meses sem aumentos nas refinarias, entre setembro de 2005 e maio de 2008. Nesse período, o barril teve alta no mercado internacional e os resultados da estatal foram afetados pela intervenção.
O aumento anunciado em 2008 foi acompanhado de uma redução dos tributos federais sobre combustíveis, para tentar amenizar o impacto no preço na bomba – o que gerou perda de arrecadação ao governo federal.
No governo de Dilma Rousseff (2011-2016), os preços de combustíveis também eram muitas vezes segurados artificialmente como forma de conter a inflação e incentivar a economia – mas isso gerou prejuízos bilionários para o caixa da estatal.
Em 2015, depois de anos de represamento artificial dos preços dos combustíveis, o aumento dos preços controlados foi um dos fatores que levaram a inflação a disparar.
Em 2017, o Ministério Público Federal do Rio de Janeiro chegou a processar o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega e a ex-presidente da Petrobras Graça Foster pelo uso da política de preços para deixar o valor dos combustíveis baixo e assim controlar a inflação.
O gráfico a seguir mostra como o preço da gasolina no Brasil passou a acompanhar o barril de petróleo a partir de 2016. Os dados estão em reais e já descontam eventuais efeitos causados por flutuações da taxa de câmbio.
CONVERGÊNCIA DESDE 2016
As discussões sobre a política de preços
A política de preços da Petrobras é alvo de debate intenso em 2022. Os defensores da política de paridade com o petróleo – que acompanha o preço internacional do barril – argumentam que a Petrobras, sendo uma empresa de capital aberto com acionistas privados, deve procurar o melhor resultado para ela mesma.
Isso significa repassar aumentos do petróleo para os consumidores, visando lucros e não necessariamente pensando no impacto social dos aumentos. Os lucros gerados, aliás, são repassados com alguma frequência aos acionistas – o que inclui a União, maior acionista da Petrobras. Portanto, quando há divisão de lucros, os cofres públicos são beneficiados. Geralmente, os defensores dessa política também criticam o intervencionismo adotado pelos governos petistas.
Já entre os críticos do atual modelo adotado pela estatal, o argumento principal é que a Petrobras, por ser uma estatal de um setor estratégico, não deve desconsiderar os efeitos que os aumentos dos combustíveis têm sobre a população e sobre a inflação.
Entre as alternativas geralmente apontadas está a criação de um fundo de estabilização de preços, para impedir que os combustíveis tenham volatilidade tão grande – embora muitos desses economistas também critiquem a forma como o governo interveio nos preços nos governos do PT, especialmente no de Dilma.
Uma proposta para um fundo de estabilização avançou no Senado em 10 de março, e agora está sob análise da Câmara dos Deputados.
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