domingo, 27 de março de 2022

Jornalismo da CNN brasil tentar falar com a famosa Wal Açaí a respeito de denuncias do MPF

 A CNN foi até  a Vila Histórica de Mambucaba onde vive Walderice Santos da Conceição, apontada pelo MPF como funcionária fantasma de Bolsonaro por 15 anos

Pedro Duranda CNN

no Rio de Janeiro

A história de uma personagem envolvida em escândalo da vida pública do presidente Jair Bolsonaro começa em uma lojinha de açaí com fachada amarela e um portão com menos de dois metros de largura.  Nessa semana, em que a dona do lugar batizado como “Wal Açaí” virou alvo de uma denúncia do Ministério Público Federal (MPF) por improbidade administrativa, o portão não abriu.

Walderice Santos da Conceição montou a loja anos atrás e vinha administrando pessoalmente o ponto de venda paralelamente ao trabalho como assessora parlamentar do gabinete do então deputado federal Jair Bolsonaro, como revelou o Jornal Folha de S. Paulo em 2018. Trabalho que, segundo procuradores federais, ela nunca fez.

Quatro anos depois, o MPF decidiu denunciar Walderice e o Presidente da República e pedir que eles devolvam os salários de 15 anos, o que supera R$ 240 mil em valores não corrigidos.

CNN questionou a assessoria de imprensa da Presidência da República e não foi respondida até o momento.

Se para o MPF, Wal do Açaí era funcionária fantasma, hoje ela faz questão de afirmar que trabalha para se sustentar. Na Vila Histórica de Mambucaba, localidade litorânea de um dos distritos do município de Angra dos Reis (RJ), Walderice improvisou um escritório na Associação de Moradores.

É que depois de perder a eleição para vereadora em 2020, com apenas 266 votos, ela ganhou um cargo comissionado na prefeitura com salário em torno de R$3 mil, mais que o dobro do que ganhava quando era, supostamente, funcionária fantasma, conforme aponto o MPF. Foi nessa associação que a CNN encontrou Wal do Açaí pela primeira vez.

“Um dia vocês vão saber a minha história, mas não hoje”, disse ela entre as tábuas da cerca do imóvel depois oferecer um copo de água.

Ponto de venda de açaí da Wal hoje é comandado pelo sobrinho, mas nessa semana tem ficado fechado / Pedro Duran/CNN

Surpreendida com a presença da CNN, ela fez ligações avisando para alguém que a reportagem estava no local. Antes do fim do expediente, por volta das 17h, deu ordens a funcionários e lavou com vassoura, água e sabão em pó o quintal do imóvel usado como escritório da prefeitura.

Para deixar o local, Walderice foi levada em um carro da empresa terceirizada Matos Teixeira, que presta serviços de zeladoria para a prefeitura. No dia seguinte, ao ser abordada mais uma vez pela CNN, pouco mais de uma hora depois de ter saído para o horário de almoço, ela foi novamente transportada no veículo e escoltada por funcionários da empresa.

“Dá pra tirar eles daqui, fazendo o favor?!”, pediu aos colegas, se referindo à equipe de reportagem que a abordava. A empresa ainda não respondeu a CNN os questionamentos  sobre a conduta dos funcionários.

“Olha só: eu estou trabalhando, eu estou no meu horário de trabalho, apesar de vocês acharem que não, eu trabalho, eu preciso trabalhar pra sobreviver, então eu não tenho nada a falar com vocês. Mas nada mesmo, vocês me desculpem, uma boa tarde”, disse ela em uma das abordagens na associação de moradores.

O que aponta o MPF

Para os procuradores que investigaram o caso, chamou atenção o fato de ela nunca ter ido a Brasília, onde deveria ter dado expediente ao longo de 15 anos. Nem sequer para a própria posse.

À CNN, Wal do Açaí, como é conhecida, não quis responder se sabia ou não que o cargo que assumira era de assessora parlamentar e na capital federal.

Em transmissão pela internet nessa quinta-feira (24), Bolsonaro admitiu que ela nunca esteve lá e criticou a investigação. “Por que [o MPF] não investiga todo mundo? Só pra cima de mim? Se bem que aqui é um tiro n’água. Dá até vergonha o MP investigar isso aí. ‘Wal nunca esteve em Brasília’. Não precisa interrogar a Wal não. Nem a mim. Eu tô confessando, ela nunca esteve em Brasília, é verdade. Tomou posse por procuração”, afirmou ele.

Sobre o pedido do MPF para devolver os 15 anos de salário, Walderice não disse à CNN se devolverá a quantia. Bolsonaro, por sua vez, já fez as contas. “Já cálculo quanto eu vou ter que devolver, R$ 300 mil reais eu tenho que devolver. Deve ter uma multa, etc… vou ser julgado”, disse ele.

Zeladora da Vila

A prefeitura de Angra dos Reis informou à CNN que “Walerice Santos da Conceição exerce atualmente o cargo de Coordenadora Técnica da Vila Histórica de Mambucaba, onde reside há mais de 50 anos”.

Conforme nota da prefeitura, ela é “responsável por coordenar os serviços públicos no bairro e, entre suas funções, estão a supervisão da manutenção de vias, limpeza pública e a interlocução entre a Prefeitura e as unidades de educação e de saúde da comunidade”. Subordinada à Secretaria Municipal de Desenvolvimento Regional, a prefeitura destacou ainda que “Walderice cumpre sua função com dedicação e comprometimento”.

Relação com Bolsonaro

Moradores da vila, que conhecem Wal há muitos anos, contaram que ela costumava acordar de madrugada para buscar jornal em uma localidade mais distante e vender de manhã cedo para moradores, turistas e veranistas. Assim teria conhecido um comprador assíduo, Jair Messias Bolsonaro.

Tido como reservado, Bolsonaro não tem muitos amigos na Vila Histórica de Mambucaba, distrito de Angra dos Reis. Há alguns anos ele não frequenta o lugar e o grande sobrado de veraneio ao lado da praia tem ficado trancado.

Há, no entanto, um amigo dele que segue morando na vila: Edenilson Nogueira Garcia ou simplesmente Denilson, como é conhecido.

Carlos Bolsonaro, Walderice Conceição, Jair Bolsonaro e Edenilson Nogueira Garcia / Reprodução/Redes Sociais

Companheiro de prosa e pesca, o homem também aparece na denúncia feita nessa semana pelo Ministério Público à Justiça. Denilson é o marido de Walderice e, para o MPF, prestava serviços particulares à  família Bolsonaro.

A tese dos procuradores foi confirmada por moradores da lugarejo. Segundo eles, Denilson fazia desde pequenos reparos, como pintura e manutenção dos portões, até o cuidado com os cães da família.

Wal lançou candidatura

Wal do Açaí é conhecida por todos. Para os mais de 200 mil moradores de Angra dos Reis, 266 votos na eleição a vereadora podem parecer pouco. Mas o número é significativo para a Vila onde o presidente e antigo patrão dela mantém uma casa até hoje.

Tanto o próprio presidente quanto o filho Flavio, senador pelo Rio de Janeiro, gravaram vídeos para tentar impulsionar a campanha dela à Câmara dos Vereadores da cidade em 2020. Não deu certo.

Como uma espécie de zeladora da vila, ela supervisiona a manutenção da área. O comércio de açaí hoje é controlado pelo sobrinho dela, que intercala o expediente com os estudos. A mãe da jovem trabalha no posto de saúde da vila, um dos equipamentos municipais que cabe à Walderice monitorar.

Ruínas históricas

Entrada da Vila Histórica do Mambucaba / Pedro Duran/CNN

Tombada em 1969 pelo Iphan, a Vila Histórica de Mambucaba está bem longe de ser destino preferencial dos turistas na Costa Verde ou na própria Angra dos Reis, que tem outras praias muito mais badaladas.

Ainda assim, mantém um movimento de turistas até mesmo fora da temporada, tem pousadas, restaurantes e alguns pontos turísticos, até mesmo fora da temporada, tem pousadas, restaurantes e alguns pontos turísticos, como ruínas antigas, uma vila de casas com fachadas restauradas e a Igreja de Nossa Senhora do Rosário.

Segundo o Iphan, a Vila é uma das primeiras ocupações urbanas do Brasil, tanto que teve tombado por inteiro seu conjunto arquitetônico e paisagístico, incluindo não só as construções como todo o traçado urbano que marca bem a ocupação do local.

Segundo o Iphan, era no Porto de Angra, na foz do Rio Mambucaba, que os escravos vindos da cidade do Rio de Janeiro passavam por uma espécie de triagem para trabalharem nas fazendas de café da serra. Os relatos dão conta de que, no século XIX, um vice-cônsul da França chegou a morar na Vila.

https://www.cnnbrasil.com.br/politica/um-dia-voces-vao-saber-minha-historia-diz-wal-do-acai/

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