Vendedor de balas foi imobilizado no chão de corredor na última terça-feira (18) e prestará queixa; versão da polícia e da empresa divergem
Menor foi algemado por dois brigadianos enquanto três seguranças tentavam retirar o vendedor de balas do shoppingReprodução / Instagram @Bruna.Rodrigues65
A repercussão do vídeo de um adolescente sendo imobilizado e algemado por dois policiais militares no chão do Shopping Bourbon Wallig, na Avenida Assis Brasil, zona norte de Porto Alegre, fez com que a Brigada Militar abrisse uma sindicância interna. A ocorrência iniciou com os seguranças do estabelecimento chamando a polícia para conter uma suposta perturbação do ambiente, segundo a subcomandante do 11º Batalhão de Polícia Militar, Michele Maria, e culminou na intervenção física de dois brigadianos a um dos quatro vendedores de doces que estavam no local.
— Eu estava vendendo bala, o que vocês estão fazendo? Parece que eu roubei vocês! O que estão fazendo!? — questionou o jovem negro de 15 anos, enquanto tinha as mãos presas por um policial, no vídeo que circula nas redes sociais.
Três seguranças e outro soldado da Brigada acompanhavam o momento da abordagem, registrado em imagens e áudio por testemunhas. A gravação foi publicada pelo perfil da vereadora de Porto Alegre Bruna Rodrigues (PCdoB) na sua conta no Instagram. Tanto no vídeo quanto nos comentários, a ação da polícia é apontada como um ato de racismo.
“Gente algemar um menino que trabalha, que mundo é este? Parece que todo o mundo resolveu mostrar e escancarar o seu lado mais perverso. Gostaria de saber se fosse um branco, bem vestido e que nem trabalha, mas basta ser branco, fariam a mesma coisa? Estou ficando com medo de ir a qualquer lugar”, questionou Márcia Vargas, seguidora do perfil de Bruna.
Segundo a subcomandante do 11º BPM, Michele Maria, as algemas foram utilizadas porque o jovem, que tem a mesma altura dos policiais, teria resistido fisicamente a uma tentativa de condução feita pelos policiais militares e seguranças do shopping. A vereadora suplente de Bruna Rodrigues e presidente da União da Juventude Socialista de POA, Fabíola Loguercio, afirma que o menor estava sentado no momento da abordagem, e que a ação foi truculenta. Michele detalha que o grupo de vendedores de balas se dispersou quando os policiais, chamados pela segurança, chegaram ao local - o adolescente que acabou algemado estaria vendendo doces na praça de alimentação, conforme informou a assessoria do Grupo Zaffari à reportagem.
Entre as versões dadas pelas vereadoras, a polícia e a administração do shopping, apenas a última afirma que os policiais já estavam no estabelecimento antes do início da ocorrência. Segundo a empresa, os garotos começaram a correr quando avistaram os brigadianos, fato que teria levado à imobilização de um deles. As outras duas partes contam outra sequência de fatos.
Depois que ele se identificou como menor de idade, as algemas teriam sido retiradas, afirma a subcomandante. O relato de Fabíola também confirma a liberação do jovem depois que amigos e um parente que estavam do lado de fora do shopping foram questionar a situação junto à polícia.
— A algema foi necessária por conta do porte físico e agitação dele no ato da resistência. Quando ele se identificou e viram que ele era menor de idade, a algema foi retirada e os ânimos se apaziguaram. Analisando toda a ocorrência, não se percebe irregularidade. O vídeo, que mostra apenas a algemação, causou repercussão. A sindicância vem para revisar e corroborar a ação da Brigada ou questionar eventuais irregularidades — argumenta a Major Michele Maria.
O que diz o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)
Para o ECA, aos 15 anos um cidadão é considerado adolescente. Não há referências diretas ao uso ou proibição de algemas, apenas um veto ao transporte de menores em espaços fechados de viaturas.
Conforma a Súmula Vinculante nº 11 do Supremo Tribunal Federal, um texto que serve como orientação aos órgãos públicos de maneira complementar à legislação vigente, o uso de algemas em menores de idade “só é lícito em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado”. Ou seja, os policiais envolvidos na ocorrência terão de apresentar uma justificativa para terem algemado o menor.
Segundo Fabíola, a vítima irá até uma delegacia registrar boletim de ocorrência na segunda-feira (24). Ela presta auxílio à família do garoto, que de acordo com a assessoria da vereadora Bruna, trabalha em frente ao shopping.
O que é uma súmula vinculante do STF?
O que diz o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)?
Leia a nota enviada à reportagem pelo Grupo Zaffari:
“A empresa informa que o rapaz estava vendendo doces na praça de alimentação, e passou a correr pelos corredores do empreendimento após notar a presença de um soldado da Brigada Militar, que se encontrava no local, e que posteriormente realizou a abordagem demonstrada pelo vídeo.”
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