#Verificamos: É falso que ferrovia ligando capitais nordestinas está sendo construída pelo governo Bolsonaro
Circula nas redes sociais um vídeo que anuncia a obra de uma estrada de ferro chamada Ferrovia do Sol. O letreiro diz que se trata de mais uma obra do presidente Jair Bolsonaro (PL). A gravação, de pouco mais de dois minutos, apresenta detalhes do circuito ferroviário que, supostamente, iria integrar os principais polos regionais do nordeste do Brasil. Seriam 2,2 mil quilômetros de rede ferroviária. A gravação também mostra como seria a arquitetura das estações. Por meio do projeto de verificação de notícias, usuários do Facebook solicitaram que esse material fosse analisado. Confira a seguir o trabalho de verificação da Lupa:
“mais uma obra do presidente bolsonaro!
FERROVIA DO SOL
CHUPEM ESSA MANGA”
Letreiro de vídeo publicado no Facebook que, até as 16h30 do dia 19 de janeiro de 2022, tinha 3,7 mil compartilhamentos
A informação analisada pela Lupa é falsa. Não existe nenhuma obra em andamento ou prestes a começar de um circuito ferroviário no Nordeste do Brasil chamado Ferrovia do Sol. A ideia de uma estrada de ferro interligando as principais cidades da região é antiga, surgiu pela primeira vez em 2013, então chamada de Trem do Sol. Contudo, esse projeto nunca foi viabilizado, nem pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), nem pelos seus antecessores. Em nota, o Ministério da Infraestrutura informou que não há, no âmbito da pasta, nenhuma obra ou projeto sobre essa ferrovia. A Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT) também informou, por email, que “no momento, não existe projeto/estudo relacionado a esse assunto”.
O vídeo foi divulgado pela primeira vez em setembro de 2020 no canal no YouTube do senador Roberto Rocha (PSDB-MA). Não é, portanto, um vídeo de anúncio de obra do governo federal. Trata-se de um material publicitário, feito pela equipe do senador, para divulgar uma ideia similar à do Trem do Sol, de 2013. A edição que circula atualmente excluiu o nome de Roberto de Rocha no canto superior direito, como consta na versão original.
No atual governo, dentre as iniciativas ferroviárias em andamento está o Pro Trilhos, programa lançado em agosto de 2021 e sancionado em 23 de dezembro de 2021 que permite que a iniciativa privada explore e construa ferrovias por meio de outorga de autorização. Ainda em dezembro, a pasta divulgou uma série de renovações em ferrovias já existentes no Brasil, como a Ferrovia Norte Sul, viabilizadas, em grande parte, por meio de leilões e concessões à iniciativa de privada. O projeto da Ferrovia do Sol não está entre essas iniciativas.
Ideia surgiu em 2013
As primeiras discussões sobre uma rede de transporte ferroviário de passageiros no Nordeste foram em 2013. Em 10 de setembro daquele ano, a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e a ANTT divulgaram que os dois órgãos assinariam um Termo de Cooperação Técnica para estudar a viabilidade da ferrovia — esse termo foi, de fato, assinado, em outubro daquele ano. Em 2015, o Trem do Sol foi pauta de uma reunião entre o então secretário de turismo do Rio Grande do Norte e lideranças da Sudene. Desde então, não foi publicada mais nenhuma informação oficial sobre a proposta.
Em setembro de 2020, o senador Roberto Rocha (PSDB-MA) publicou em suas redes um vídeo apresentando um projeto chamado Ferrovia do Sol, bastante similar ao Trem do Sol. Em nota, a assessoria de imprensa do congressista informou que a proposta é de autoria de Rocha, e não do governo. “Desde que o projeto foi idealizado pelo senador Roberto Rocha, o parlamentar tem conversado com colegas das bancadas federais dos estados nordestinos e ministros do Governo, com a finalidade de apresentar a Ferrovia do Sol como uma obra viável e benéfica ao Brasil, inclusive para receber turistas estrangeiros. A intenção é que apenas o projeto seja custeado por recursos públicos e a obra em si por meio da iniciativa privada”, diz a nota. Apesar de ter divulgado o projeto como sendo de sua autoria nas redes sociais, não foi localizada no site do Senado nenhuma proposição formal sobre o assunto.
Em razão da pandemia, justificou o assessor, somente assuntos relacionados à Covid-19 têm sido corretamente priorizados no Congresso Nacional e no Governo Federal e, por isso, o projeto ainda não teve andamento.
Vale pontuar que a primeira menção a um projeto chamado Ferrovia do Sol, contudo, é do blog de turismo Viaje de Trem, que em 24 de junho de 2013 publicou um texto intitulado “Trilhos Imaginários do Brasil 1 – Ferrovia do Sol”. Esse conteúdo apresentava um mapa com uma linha imaginária ligando as principais capitais do nordeste numa inventada “Ferrovia do Sol”. “Se fosse concretizada, seria um sonho turístico, ligando as capitais nordestinas (Salvador, Aracaju, Maceió, Recife, Natal e Fortaleza via Mossoró). Não deveria ser uma linha de alta velocidade, mas um ‘trem-hotel’, incluindo carros panorâmicos e carros-dormitórios (…)”, dizia o texto.
Nota: esta reportagem faz parte do projeto de verificação de notícias no Facebook. Dúvidas sobre o projeto? Entre em contato direto com o Facebook.
Editado por: Chico MarésO conteúdo produzido pela Lupa é de inteira responsabilidade da agência e não pode ser publicado, transmitido, reescrito ou redistribuído sem autorização prévia.
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Falece empresário Adel El Awar
Publicado em 24 de janeiro de 2022
ADEL KASSIM EL AWAR
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Faleceu às 4h30 de ontem (23/01/22), de morte natural, em sua residência, em Teófilo
Otôni-MG, o empresário e ruralista Adel Kassim El Awar. O velório aconteceu na
Loja Maçônica Templários do Mucuri NR 42, na Av. do Visconde do Rio Branco. O
sepultamento ocorreu ainda na tarde de ontem, no Cemitério Municipal da cidade.
Adel nasceu em 27 de julho de 1927, nas montanhas de
Kornayel, no Líbano. Veio para o Brasil na década de 1050, após passar por
países da África. Em Teófilo Otôni, chegou com a quantia de 100 mil dólares,
que aplicou na atividade comercial. De visão aguçada, soube multiplicar seu
capital por diversas vezes, tornando-se um dos maiores e mais importantes
comerciantes do município e região.
Por dezenas de anos esteve à frente do Magda Magazin, por
ele fundado e nomeado em homenagem à filha. O empresário também adquiriu
fazendas, dedicando-se à pecuária. Apesar da idade avançada, somente há pouco
tempo encerrou suas atividades.
Constituiu fortuna, tendo deixado diversos imóveis valiosos,
inclusive a casa de residência (talvez a melhor da cidade, localizada no ponto mais privilegiado da área urbana).
Adel El Awar, que era um dos últimos representantes da velha
guarda da imigração libanesa em Teófilo Otôni, deixa viúva a Sra. Nada
Alameddine, os filhos Magda e Adel Júnior, além de netos e centenas de bons
amigos. (foto: Instagram)
https://diariodomucuri.com.br/falece-empresario-adel-el-awar/
Depósito clandestino de gás interditado pela Polícia Civil em Rio das PedrasDepósito clandestino de gás interditado pela Polícia Civil em Rio das Pedras Foto: Divulgação
Luã MarinattoTamanho do textoA A A
Em um dos tentáculos do crime organizado no Rio, até 80% do
mercado de botijões de gás de cozinha estão nas mãos de milicianos e
traficantes, segundo a Associação Brasileira dos Revendores de GLP (Asmirg). É
diante dessa realidade que tanto o governo federal quanto o estadual lançaram
recentemente programas para ajudar a população mais vulnerável a comprar esse
item tão básico do cotidiano. E uma encruzilhada se impõe: o temor de que o
alívio no orçamento das famílias acabe, no fim da linha, alimentando
indiretamente os caixas das quadrilhas que controlam o negócio. Só com a
primeira parcela do Auxílio Gás do Ministério da Cidadania, paga ao longo deste
mês, entre R$ 18 milhões e R$ 20,6 milhões podem parar nos cofres de
distribuidores ligados ou explorados pelos criminosos.
O problema ocorre, sobretudo, em favelas e áreas
conflagradas, onde as quadrilhas agem cooptando vendedores clandestinos,
impondo ágio sobre o preço normal, obrigando consumidores a pagarem mais caro
pelo gás e até lavando dinheiro oriundo de outras práticas ilícitas. De acordo
com a Asmirg, que reúne comerciantes do gênero de todo o país, a situação é
especialmente grave na Região Metropolitana, que concentra 72,5% das famílias
favorecidas pelo auxílio federal, cujo pagamento da primeira parcela vai até 31
de janeiro.
— O Rio de Janeiro virou uma realidade à parte no setor. A
pessoa tem uma revenda regularizada, mas, se o funcionário atravessa a rua e
faz negócio onde não deve, pode ser executado — lamenta Alexandre José
Borjaili, presidente da Asmirg há 15 anos, que prossegue: — Sabemos que de 70%
a 80% do mercado do estado encontram-se nessa situação. Esse cenário faz com
que qualquer ação do governo tenha muita dificuldade de chegar ao consumidor
final. Digo isso não só em relação ao vale-gás, mas também quando há alguma
política estatal que tenta fazer controle de preços. Se é o crime que, em
última instância, controla a venda, do que adianta?
No caso do Auxílio Gás federal, o objetivo é amenizar os
efeitos da inflação galopante para 494.934 famílias fluminenses, que receberão
R$ 52 para ajudar na compra do botijão. O benefício, que pagará um total de R$
26 milhões a moradores do Rio nesta primeira parcela, se soma a um voucher com
o mesmo fim anunciado na última semana pelo estado, destinado a áreas atendidas
pelo recém-lançado projeto Cidade Integrada. Na semana passada, o governador
Cláudio Castro afirmou que a proposta de fornecer um voucher, e não a quantia
em espécie, tem justamente o objetivo de evitar que o dinheiro pare nas mãos do
crime.
Os números do setor apontam o quão lucrativos podem ser os negócios ilegais. O Rio é responsável pelo terceiro maior mercado de gás de cozinha do país, atrás apenas de São Paulo e Minas Gerais. O estado conta com 1.815 revendas varejistas devidamente autorizadas pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), responsável por fiscalizar o setor. São pouco mais de 2 milhões de botijões comercializados todos os meses, dos quais ao menos 1,4 milhão, nas contas da Asmirg, fazem parte da cadeia controlada pelo crime organizado.
A pesquisa periódica da ANP aponta que, atualmente, o preço
médio do botijão de 13kg em solo fluminense é de R$ 92,31. Já investigações da
Polícia Civil indicam que a taxa imposta pelos bandidos costuma ser de, no
mínimo, 20% sobre o valor original, o que faz com que, nessas áreas, o produto
custe ao menos R$ 110, podendo ir a R$ 120 ou R$ 130. Uma matemática que
resulta em um lucro bruto mensal superior a R$ 25 milhões com a prática
criminosa estado afora — valor, aliás, similar ao total a ser desembolsado pelo
governo federal, no Rio, nesta primeira parcela do Auxílio Gás.
A venda dos botijões, porém, não é vantajosa para o crime
apenas pelo faturamento milionário. Em abril de 2020, uma grande operação da
Polícia Civil prendeu quatro suspeitos de lavarem dinheiro para uma milícia que
agia em Nova Iguaçu e Seropédica, na Baixada Fluminense. O esquema envolvia
revendedoras de gás e, segundo os investigadores, movimentou quase R$ 200
milhões em cinco anos. Seis meses antes, outra ação havia colocado atrás das
grades Fábio Pinto dos Santos, o Fabinho São João. Chefe do tráfico nas favelas
de São João e de Manguinhos, ele criou empresas de distribuição de gás no nome
de parentes e as utilizava para tentar legitimar o ganho com a venda de droga.
— Eles usam uma técnica de mescla para lavar o dinheiro.
Pegam recursos supostamente limpos, porque a venda de gás, mesmo que não
regularizada, gera renda, e incluem no fluxo outros negócios da quadrilha. Se
você olha os números a fundo, é como se a empresa comercializasse botijão para
o Brasil inteiro — afirma o delegado Thiago Neves Bezerra, que participou das
duas investigações e hoje comanda a Delegacia de Repressão às Ações Criminosas
Organizadas (Draco): — Nessas regiões, a maioria das pessoas compra em espécie,
não tem nota fiscal nem controle, e por isso a venda de gás é tão utilizada com
esse fim.
Na última quarta-feira, em meio às primeiras operações do
Cidade Integrada no Jacarezinho e na Muzema, a Delegacia de Defesa de Serviços
Delegados (DDSD) fechou três depósitos ilegais de gás de uma vez em Rio das
Pedras, um dos maiores redutos milicianos do Rio, e prendeu sete suspeitos.
Ainda no contexto do novo projeto, o governo estadual anunciou que o auxílio
deverá ser utilizado apenas em distribuidores regulamentados, de modo a
"cortar a fonte de renda das quadrilhas". Questionado pelo GLOBO, o
governo não comentou o domínio criminoso sobre o mercado de gás nem como
pretende fazer o controle do benefício recém-criado, o que tampouco foi
esclarecido na apresentação oficial do programa, no sábado.
Depósito clandestino de gás interditado pela Polícia Civil em Rio das PedrasDepósito clandestino de gás interditado pela Polícia Civil em Rio das Pedras Foto: Divulgação
Baixada e Zona Oeste são as áreas mais críticas
Os dados do Ministério da Cidadania não permitem saber em
que bairro vive quem está recebendo o benefício. A análise por município,
porém, revela que metade das seis cidades com mais favorecidos fica justamente
na Baixada Fluminense, região apontada pela polícia, ao lado da Zona Oeste,
como a mais sensível à atuação de bandidos nesta seara. Segunda colocada na
lista, só atrás da capital, Nova Iguaçu tem, por exemplo, 55.654 famílais aptas
a receber os R$ 52, mais do que o dobro do que São Gonçalo, que tem população
32% maior e aparece duas posições abaixo, com 26.116 beneficiados.
— É uma questão endêmica, que atinge várias partes do
estado, mas eu diria que 90% do problema se concentra na Baixada e na Zona Oeste.
No ano passado, só a nossa delegacia interditou de cerca de 250 depósitos
clandestinos, quase sempre resultando na prisão do responsável pelo local por
crime contra a economia popular, que é inafiançável — diz o delegado Pedro
Bittencourt, titular da DDSD, que detalha a operação criminosa: — Não é
exatamente o miliciano ou traficante que vende o gás, o serviço é terceirizado.
Ele se associa a um pequeno comerciante, em geral morador, que monta um
depósito clandestino, sem o registro obrigatório na ANP. O bandido promete
proteção e reserva de mercado, já que outros não poderão vender ali, e, como
contrapartida, cobra uma taxa em cima de cada botijão. Se ele não paga, não
pode operar. No fim das contas, quem mais perde é o cidadão de bem, que acaba
obrigado a gastar mais, já que o preço é tabelado, sempre bem acima do
praticado e sem qualquer chance de livre concorrência.
Morador da Carobinha, em Campo Grande, o porteiro X., de 42
anos, sente na pele — e no bolso — o peso do problema. Sob condição de anonimato
por temer retaliações, ele conta que, em pouco mais de dois anos, viu o valor
gasto com gás de cozinha disparar. Ele vive na comunidade, dominada por
milicianos e palco de frequentes disputas com o tráfico, há mais de duas
décadas.
— Quem mora aqui sabe há tempos como é. Só pode comprar o
botijão de quem eles autorizam. Se eu trouxer um de fora e chegar empurrando,
já dá problema. Hoje, não gasto menos de R$ 110 para comprar um botijão. O
jeito é tentar fazer durar mais pra compensar — conta o porteiro, que vive com
a esposa e três filhos em uma casa de três cômodos. A família já recebeu outros
benefícios sociais, mas ainda não sabe se está na lista de favorecidos pelo
Auxílio Gás federal.
De acordo com o Ministério da Cidadania, receberão os R$ 52 todos
os brasileiros inscritos no Cadastro Único (CadÚnico) com renda familiar mensal
per capita menor ou igual a meio salário mínimo, ou famílias com integrantes
que recebem o Benefício de Prestação o Continuada (BPC). O valor do pagamento
bimestral é calculado a partir da média nacional do preço do botijão de 13kg de
GLP, atualmente em R$ 104. Ao todo, no país, serão R$ 285 milhões distribuídos
entre 5,5 milhões de famílias nesta primeira parcela.
— É um auxílio voltado para pessoas em situação de vulnerabilidade.
Nessas comunidades, de modo geral, as pessoas já têm uma renda inferior do que
em outros lugares, e mesmo assim pagam mais pelo gás. É uma distorção cruel,
mas temos, na verdade, duas partes sendo lesadas: a de quem necessita dessa
assistência e também os fundos públicos, que, em um momento de crise econômica
e mesmo que não intencionalmente, vão financiar indiretamente essas quadrilhas
— analisa Daniel Hirata, professor de Sociologia e coordenador do Grupo de
Estudos dos Novos Ilegalismos (Geni), da Universidade Federal Fluminense (UFF).
Além do problema relativo aos revendedores clandestinos, sem
qualquer tipo de regulamentação junto aos órgãos responsáveis, também há
situações em que distribuidoras legalizadas se aliam ao crime. Neste caso, de
acordo com a ANP, os responsáveis podem perder o registro em definitivo, ficar
impedidos de atuar no setor por cinco anos e receber multas que variam de R$ 5
mil a R$ 5 milhões. "Em geral, a polícia investiga, identifica e reprime
os criminosos, e a ANP atua no ambiente administrativo reprimindo os agentes
regulares que, comprovadamente, associam-se às atividades criminosas",
explicou, por nota, a agência, acrescentando que realizou 94 ações de
fiscalização em revendedores de GLP do Ro no ano passado, espalhadas por 36
municípios. Já a Ouvidoria do órgão recebeu 85 denúncias relativas a esse
mercado, "sendo metade por comércio clandestino".
— É uma área que precisa de regulamentação estatal, de
fiscalização. Não se resolve só com a parte repressiva, com polícia. É o típico
caso no qual uma ação eficiente do poder público garantiria não só um preço
justo para a população, mas também ajudaria a desmonetizar esses grupos
armados, porque impacta diretamente nas bases financeiras — pontua o professor
da Daniel Hirata.
Depósito clandestino de gás interditado pela Polícia Civil em Rio das PedrasDepósito clandestino de gás interditado pela Polícia Civil em Rio das Pedras Foto: Divulgação
Origem nas milícias e rápida expansão para o tráfico
O início da exploração da venda dos botijões de gás remonta
à expansão das milícias na cidade do Rio, na virada dos anos 2000. Tal qual
faziam com outros serviços básicos, como o sinal de televisão e a internet, os
paramilitares passaram a controlar o setor a mão de ferro, exercendo monopólio
quase total em suas áreas de atuação. De lá pra cá, contudo, o mesmo modus
operandi foi adotado por traficantes de diversas regiões.
Um dos primeiros a empregar essa tática foi Fernando Gomes
de Freitas, o Fernandinho Guarabu, morto pela polícia em 2019, após quase duas
décadas chefiando a venda de drogas em favelas da Ilha do Governador, na Zona
Norte. No bairro, tanto a venda de botijões quanto a circulação de vans — outra
prática com origem nas milícias — rendiam farto lucro ao criminoso.
Em 2004, investigações e informações colhidas pelo
Disque-Denúncia (21 2253-1177) já apontavam que, no esteio um auxílio para
compra de gás pago à época pelo governo federal, várias comunidades cariocas
registravam monopólio do comércio de botijões por parte do tráfico, que impunha
sobretaxas aos moradores. Além da própria Ilha do Governador, a prática foi
constatada, na ocasião, em locais como Borel, Salgueiro, Mangueira, Manguinhos,
Vidigal, Rocinha e nos complexos da Maré e do Alemão, entre outras favelas.
O mesmo Disque-Denúncia continua recebendo, passados 18
anos, relatos frequentes sobre o problema. Foram 14 contatos do gênero junto ao
serviço desde o início de 2021, dois terços relacionados à atuação do tráfico,
e o restante de milícias — além de denúncias nas quais os dois grupos aparecem
agindo em conluio para maximizar o faturamento. As queixas abrangem comunidades
em Guaratiba, Jacarepaguá, Colégio e Bangu, todos bairros da capital, além dos
municípios de Duque de Caxias, Belford Roxo e São João de Meriti, na Baixada
Fluminense, e das cidades de Itaboraí e Petrópolis.
Nos últimos anos, com o aumento das ações repressivas contra
os depósitos clandestinos, os grupos criminosos vêm mudando de estratégia para
tentar driblar a polícia. Se antes era comum encontrar espaços com centenas de
botijões armazenados, hoje as quadrilhas preferem pulverizar a atividade em
distribuidores menores, mantendo vários pontos de abastecimento.
— É uma maneira de tentar diminuir o prejuízo, já que os
botijões também acabam apreendidos, e não são devolvidos. Além disso, muitas
vezes o responsável pelo local tenta argumentar que aqueles botijões não são
para venda, mas de posse pessoal, por mais óbvia que seja a mentira — explica o
delegado Pedro Bittencourt, da DDSD, lembrando também o risco inerente ao
armazenamento inadequado desse tipo de material: — Existem várias exigências
técnicas que um distribuidor legalizado precisa cumprir. Já tivemos casos,
inclusive, de explosão nesses locais.
Procurada, a Polícia Civil reforçou os dados repassados pelo
delegado da DDSD e frisou a atuação da Força-Tarefa de combate às milícias,
que, de acordo com a corporação, já prendeu mais de 1.100 paramilitares. Ainda
segundo o órgão, o prejuízo causado às quadrilhas com a atividade do grupo
especializado, que reúne várias delegacias, é de cerca de R$ 2,2 bilhões. Já o
Ministério da Cidadania não respondeu aos questionamentos da reportagem sobre o
tema.
A ANP, por sua vez, informou que "desconhece a
fundamentação técnica e cientifica dos cálculos relativos às atividades
criminosas relacionadas com o comércio de GLP". A agência afirmou ainda
que tem "preocupação constante" com "situações de
irregularidades no mercado de combustíveis" e que atua "de forma
direta no combate às irregularidades administrativas e em parcerias com os
órgãos de segurança pública, quando há envolvimento de práticas
criminosas". "Nesse cenário", acrescenta a ANP, "é
importante estimular e valorizar a atividade regular".
Após a publicação da reportagem, Sindigás, entidade que
reúne empresas distribuidoras de GLP, enviou a nota abaixo:
"O Sindigás, entidade que reúne empresas distribuidoras
de GLP, considera extremamente sobrestimado o dado de que de 70% a 80% da venda
de botijões de gás no estado do Rio estejam dominados pelo tráfico e pela
milícia, conforme noticiado. É de conhecimento que as áreas fora do controle do
Estado concentram-se em parte da Região Metropolitana e da Baixada Fluminense.
Tal informação somente poderia ser gerada de forma crível por autoridades da
segurança pública que mapeiam as áreas ocupadas por esses poderes paralelos.
O Sindigás reforça ainda que os empreendedores das revendas
e os distribuidores atuam dentro da legalidade e desempenham suas atividades de
forma idônea, fornecendo o produto com segurança, presteza, qualidade e
assistência técnica, respeitando as normas a que estão submetidos.
Por fim, o Sindigás lamenta que o Auxílio Gás, programa
considerado uma conquista da sociedade brasileira no combate à pobreza
energética, tenha seus benefícios questionados ao serem aventadas hipóteses de
que os recursos do programa poderiam ser apropriados indevidamente por agentes
criminosos.
O Sindigás e seus associados reiteram que estão, como sempre estiveram, à disposição das autoridades para colaborar com a garantia de um ambiente de negócios competitivo, que resulte na excelência da oferta de produto e da prestação de serviços para o consumidor."
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