De acordo com a psiquiatra Ana Paula Carvalho, há três tipos menos conhecidos e comuns na população: depressão psicótica, distima e bipolar
A pandemia de covid-19 tem posto em risco não só a saúde física, mas mental da população. O isolamento imposto pelas medidas para conter a propagação da doença, a crise econômica, o desemprego e a própria ansiedade em relação à contaminação são alguns fatores que colocam à prova nosso bem-estar psicológico.
Não é à toa que estudos mostram um aumento nos índices de depressão, doença que atinge mais de 320 milhões de pessoas no mundo, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS).
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A depressão que impacta a maioria dos pacientes é a unipolar, também conhecida como transtorno depressivo maior. A causa mais comum é de cunho genético, mas também pode ser provocada por perdas, estresse e até problemas neurológicos.
Mas existem classes diferentes de depressão. De acordo com a psiquiatra Ana Paula Carvalho, coordenadora da Liga de Depressão do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), há três tipos menos conhecidos e comuns na população: depressão psicótica, distima e bipolar.
"No caso dessas doenças, muitas vezes o diagnóstico deixa de ser feito pelo próprio psiquiatra ao longo dos anos, passando despercebido e sem uma avaliação criteriosa. Na depressão bipolar, por exemplo, a descoberta pode levar mais de dez anos, dificultando o tratamento", diz a psiquiatra.
Por serem mais difíceis de diagnosticar, é importante conhecer melhor cada uma.
Depressão bipolar: a mais difícil de ser identificada
O transtorno bipolar do tipo 1 é a forma mais clássica e é caracterizado pela euforia (mania e hipomania). Já o do tipo 2, que é a depressão bipolar, o paciente apresenta quadros de tristeza e hipomania — estado mais leve de euforia, otimismo e, às vezes, agressividade.
"Geralmente, quando ocorre somente a bipolaridade é mais fácil de reconhecer a doença, já que o paciente apresenta sintomas evidentes. Porém, quando o quadro depressivo aparece em conjunto, pode levar anos até chegar a um diagnóstico preciso", afirma Luiz Dickeman, psiquiatra da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
O especialista explica que, para o paciente ser caracterizado com a condição, ele precisa ter episódios de hipomania pelo menos uma vez ao longo da vida, durante quatro dias ou mais.
"Ele deve ser expor a atividades de risco como gastos excessivos, vontade exacerbada de fazer sexo, pouca horas de sono."
Um estudo publicado na revista Brasileira de Psiquiatria mostrou que, em média, leva-se oito anos para diagnosticar um paciente com depressão bipolar.
Outras publicações americanas já mostraram que o diagnóstico pode demorar até 15 anos.
"O erro ocorre pelo próprio médico, que não investiga os sintomas a fundo e acredita que a pessoa sofra somente com a unipolar, que é a mais comum e conhecida. Além disso, o paciente omite se já teve episódios de hipomania em anos, aumentando, muitas vezes, o risco de suicídio", diz Dickeman, que também é diretor do Instituto Brasileiro de Farmacologia Prática (BIPP).
Fabiano Alves Gomes, psiquiatra e professor da Queen's University, no Canadá, explica que, enquanto a prevalência da depressão unipolar é de aproximadamente 15%, as formas mais clássicas do transtorno bipolar (tipo 1 e tipo 2) têm prevalência em cerca de 3% da população.
Neste tipo, o tratamento mais indicado não é com antidepressivos, e sim, com estabilizadores de humor. "É possível atingir recuperação completa principalmente se tratada adequadamente e no início", afirma Gomes.
Distimia: menos conhecida entre os próprios pacientes
O transtorno depressivo persistente ou distimia é uma depressão crônica, caracterizada por sintomas que duram por até dois anos ou mais. A causa ainda é pouco conhecida pelos médicos, mas os especialistas acreditam que seja multifatorial.
Ela é menos comum, e o próprio paciente pode não reconhecê-la por achar que os sinais estão relacionados à personalidade.
"É a típica pessoa que reclama toda hora, que tem uma visão pessimista das coisas e vive em uma rotina de lamentações. O que dificulta o diagnóstico é que na grande maioria dos casos, familiares e amigos acham que é o 'jeito' dela e que vai passar com a idade", afirma Carvalho.
No entanto, os sintomas podem evoluir para uma depressão mais grave. "O paciente demora a procurar ajuda porque acredita que não é nada e o quadro depressivo só piora.
"Às vezes, permanece com o problema por 20 anos, até ir ao médico. O distêmico está abaixo da linha da normalidade", reforça a especialista.
Diferentemente da unipolar, na qual os neurotransmissores são afetados, a distimia não altera as funções biológicas do paciente.
"É uma pessoa funcional, que come, dorme, consegue trabalhar. O grande problema é que a doença provoca um impacto bem grande na qualidade de vida, já que o indivíduo reclama o tempo todo, está sempre de mau humor e sofre com baixa autoestima", diz Dickeman.
O tratamento mais indicado é a combinação de medicamentos em doses geralmente mais altas do que os da depressão unipolar, além de psicoterapia.
Depressão psicótica: a forma mais grave do transtorno
Além de tristeza, o paciente sempre apresenta sintomas psicóticos como alucinações e delírios. "É uma alteração dos cinco sentidos. Você pode ouvir e ver coisas, sentir cheiros e até toques na pele", explica Dickeman.
Considerada rara pelos médicos, a depressão do tipo psicótica é provocada por luto, traumas ou cobrança excessiva em relação a si mesmo.
Segundo o psiquiatra da Unifesp, ela é mais fácil de diagnosticar, já que os sintomas são percebidos nos primeiros atendimentos. Porém, o que acontece muitas vezes, é que a doença causa um desgaste familiar muito grande, e o paciente fica fora de si com frequência.
"Quase não é conhecida pelas pessoas e acaba surpreendendo todos que convivem, porque os sintomas são exacerbados. Às vezes, os sintomas são confundidos com os da esquizofrenia", diz.
Neste quadro depressivo, as chances de reações suicidas são maiores e, por isso, familiares devem ficar atentos. É necessário ter um acompanhamento médico frequente até a melhora dos sintomas.
"É fundamental distinguir os vários tipos de depressão, pois o tratamento é diferente. A depressão psicótica exige associação de antipsicóticos. Todas podem ser feitas com técnicas de estimulação magnética e eletroconvulsoterapia que proporcionam bons resultados. Caso não sejam tratados, os pacientes permanecem deprimidos e além dos sofrimentos psíquicos apresentam perda de funcionalidade, dificuldades cognitivas, adoecimento fisico e risco de suicídio", diz Fabiano Alves Gomes.
Crise hídrica: Vale do Mucuri pode reviver caos de 2015
Pesquisa feita por professor da UFVJM mostra que crise de
2015 não foi superada; cidades têm menos árvores e choveu menos do que o
esperado
FP
Felipe Pereira - Especial para o EM
03/09/2021 18:41 - atualizado 03/09/2021 19:00
Em 2015, Itambacuri viveu um período de seca completa. Não havia água para abastecimento
(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press - 6/11/15)
Olhar para o céu em tempos como esses deixou de ser um sinal de esperança. Passou a ser de medo e apreensão. Com pouca chuva, a estiagem castiga o interior mineiro, que vê cada vez mais perto o fantasma do racionamento de água por causa da crise hídrica.
O Estado de Minas contou como o Norte de Minas tem
enfrentado o período de seca intensa . Mas essa não é a única região que passa
pela estiagem com severas consequências.
E para quem mora em Itambacuri, no Vale do Mucuri, a
sensação é de repetição de um problema enorme. Em 2015, a cidade se viu seca .
O rio que corta o município tinha um filete minúsculo, era impossível captar
água. Moradores disputavam baldes de água que chegavam em caminhões pipa.
A dona de casa Maria Vieira, de 56 anos, lembra até hoje o
perrengue que passou. "Não tinha água para cozinhar, nada. Era
desesperador", afirmou. Na época, ela morava na região central da cidade,
e hoje vive em um sítio na zona rural. E tem medo de reviver o problema.
"A gente economiza como pode, mas tenho medo de passar
por tudo isso de novo", diz.
A prometida barragem, que deveria ter saído do papel antes
da crise de 2015, só foi construída de fato no ano passado. Hoje, a avaliação
do Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE) é que aquele mesmo cenário de seis
anos atrás não vai acontecer novamente, mas a autarquia está preocupada com o
avanço da estiagem.
Ainda não há falta d'água, mas a cidade pede a
conscientização dos moradores para evitar o desperdício.
Sem árvores, sem chuva: uma combinação perigosa
Esta semana foi atípica, com pancadas de chuva e até alerta
para grandes acumulados de água na região . Mas, segundo o sociólogo Leonel de
Oliveira Pinheiro, especializado em cooperativismo, e que hoje dá aulas na
Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), ainda é pouco
para afastar o fantasma do racionamento.
Desde 2010, ele estuda os efeitos da seca, das mudanças
climáticas e da situação da vegetação das cidades, especialmente para
produtores rurais que se unem em cooperativas e aqueles que sobrevivem do
campo, como parte do Grupo de Extensão e Pesquisa em Agricultura Familiar
(GEPAF). Para ele, a situação só tem piorado.
A região é cortada pelos rios Mucuri, Pampã e Jequitinhonha,
mas o mapa é "desigual" nesse sentido. Há cidades que não são
banhadas por nenhum desses rios, e em outros municípios a calha não é grande,
pela própria composição geográfica.
A região do semi árido mineiro está sob influência de La
Niña, efeito climatológico da diminuição da temperatura da superfície das águas
do Oceano Pacífico Tropical Central e Oriental, reduzindo a quantidade de
chuvas e deixando o clima no Sudeste ainda mais seco.
Leonel de Oliveira Pinheiro, pesquisador do Grupo de Extensão e Pesquisa em Agricultura Familiar (GEPAF), aponta situação crítica no Vale do Mucuri
(foto: Divulgação)
Pinheiro aponta que a arenização, novo nome dado pelos biólogos ao processo de "desertificação", é grande no Vale do Mucuri. Ou seja, menos árvores, menos vegetação, que ajuda no processo das chuvas.
O município de Carlos Chagas, por exemplo, tem apenas 2% de
área de vegetação, um número muito baixo, que contrasta com o solo fértil.
"É claro que esse não é o único fator. Temos uma queda
gradativa desde 2010 da quantidade de chuvas na região, o aumento do calor. É
uma somatória de problemas que se transforma nesse caos", disse o
professor.
A prefeitura de Carlos Chagas reconhece o problema, mas
lembra que também sofre com essas consequências. Em 2016, produtores rurais
perderam cabeças de gado e muitos também tiveram lavouras perdidas.
Hoje, algumas comunidades mais afastadas já enfrentam o
desabastecimento. A prefeitura leva caminhões pipa e estuda canalizar água para
espaços de uso coletivo. É justamente os bairros mais distantes que preocupam.
Carlos Chagas implantou um sistema teste de captação de água para que a população mais afastada possa ter abastecimento
(foto: Prefeitura de Carlos Chagas/Divulgação)
Em Nanuque, distância também é problema
O estudo mostra que Nanuque e Carlos Chagas, por exemplo,
têm uma grande área territorial, mas poucos moradores, a chamada baixa
densidade demográfica.
"É a matemática difícil de conseguir levar água para
todos os locais, por mais difíceis que sejam de alcançar. É por isso que outras
políticas precisam ser pensadas para que a água chegue a todos", analisa o
professor.
Ao Estado de Minas , o diretor da Divisão de Agropecuária e
Acesso a Mercados da prefeitura, Rogério Delamare, explica que, assim que a
estiagem chegou, o Conselho de Desenvolvimento Rural foi reunido, com visita
técnica para conhecer a situação e estudar técnicas de conservação e
armazenamento de água.
"Já fizemos uma unidade demonstrativa para que sirva de
experiência piloto para quem queira conhecer. Estamos em processo de elaboração
de Acordo de Cooperação com o GEPAF para que seja realizado mapeamento das
nascentes nas bacias hidrográficas e uma imediata ação de proteção dessas
nascentes", explica.
A cidade tem cinco poços artesianos abertos na zona rural,
mas não estão ativos. A prefeitura enviou um ofício à Copasa e à Copanor para
que as instalações sejam concluídas.
Além disso, segundo Delamare, o município também avalia a
implementação de "tecnologias sociais", como uma caixa seca para
guardar a água da chuva, pluviômetros para verificar a quantidade dessas
chuvas, barraginhas nos rios que cortam a região e viveiro de mudas nativas
para reflorestamento das nascentes. Um processo de retomada dos plantios está
em andamento, e a estimativa é que hoje a arborização tenha subido para 3%.
"Temos notado uma vontade das pessoas em ajudar a
recuperar áreas de vegetação, e com os programas que temos previstos, a ideia é
aumentar mais esse número", finaliza o diretor.
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