Para levar a denúncia adiante, Jéssica precisou manter
conversa com coronel Cássio Novaes na internet
Após ter denunciado um tenente-coronel por assédio sexual e
ameaças de estupro e de morte, a policial Jéssica Paulo do Nascimento, de 28
anos, requisitou medidas protetivas para ela e sua família. As informações são
do Portal G1.
Apesar de o caso correr em segredo de Justiça, a identidade
do acusado foi divulgada no final da tarde desta quarta-feira (28). Trata-se do
coronel Cássio Novaes, que atuava em cargos de chefia na capital paulista. Ele
foi afastado de suas funções após a repercussão do caso e a investigação é
conduzida pela Corregedoria da PM.
“Ele mesmo diz que tem contatos com desembargadores e, por
ele ostentar um cargo de alta patente, há um risco que ele possa intervir no
andamento do inquérito militar”, explica.
“Ele pode coagir testemunhas, alterar provas. O pleito é
para ele não intervir de forma a prejudicar as investigações. E, também, pela
periculosidade presente nas ameaças”, continua o advogado da vítima.
“Neste primeiro momento, pedimos à Corregedoria para que
proíba o coronel Cássio Novaes de frequentar ou se deslocar à Baixada Santista,
pois é lá onde Jéssica está morando atualmente e ele [o coronel] sabe disso”,
afirma o advogado.
Entenda o caso
A vida da policial Jéssica Nascimento se transformou em um
pesadelo desde que ela conheceu o coronel Cássio Novaes. O homem havia acabado
de assumir o comando do Batalhão da Zona Sul de São Paulo, quando passou pelas
companhias para se apresentar aos policiais militares e a conheceu, chamando-a
para sair assim que conseguiu ficar a sós com ela.
Jéssica disse ao superior que era casada e tinha filhos,
recusando o convite. “Tentei ser educada, expliquei que era casada, tinha
filhos, mostrei a minha aliança. Hoje eu vejo como era inocente. Porque, a
partir dali, começou a perseguição contra mim”, desabafa.
A policial relata episódios de investidas sexuais,
principalmente, por mensagens, ameaças por áudio, humilhação em frente aos seus
colegas e até mesmo sabotagem quando se recusou a ceder aos pedidos de seu
superior.
“Como eu não cedia e percebi que ele não ia desistir, fui
fazer o teste para o Corpo de Bombeiros, queria sair de onde estava. Mas ele me
sabotou, não permitiu. E o pior, quando soube que eu queria sair da companhia,
ele me transferiu para um batalhão que fica a 40 quilômetros da minha casa.
Mesmo sabendo que eu tinha dois filhos ainda bebês”, detalha.
Ela relata, ainda, que após esta transferência, marcou uma
reunião para conversar com o comandante, mas que foi humilhada na frente de
outros quatro colegas de farda. “Ele me humilhou demais, me rebaixou, me
comparou com uma vagabunda. Saí de lá [da reunião] me sentindo pior que um
lixo”, desabafa.
Um tempo depois, já cansada da perseguição, a soldada contou
tudo ao capitão da 1ª Companhia. Ele a orientou a pegar um atestado de 6 meses,
para garantir o seu afastamento por instabilidade emocional e ficar longe das
investidas do comandante.
“Mas não adiantou. No início de 2019, solicitei uma licença
não remunerada de dois anos. Sugeri então ao meu marido que procurássemos um
outro lugar para viver. Assim, viemos para a Praia Grande, para onde ele
conseguiu se transferir. Mudei meu número de telefone e tudo parecia estar
bem”.
Jéssica chegou a ficar dois anos e meio afastada do serviço
para evitar contato com Cássio Novaes. No entanto, a licença acabou no mês
passado e ela precisou voltar ao serviço. Ele conseguiu o telefone dela e as
investidas recomeçaram e, segundo ela, cada vez mais insistentes.
“Eu pensei que precisava de provas porque ele sempre ia fazer
isso e ninguém ia acreditar. Entrei em contato com um advogado e ele me
orientou a ver até onde ele iria, deixando ele falar”, conta. “Foram coisas
muito baixas. Me ameaçou de estupro e de morte”.
As ameaças de morte vieram também por áudios. Em uma das
falas, o comandante afirma que “não existe segredo entre dois, um tem que
morrer” e “quem não tem problema na vida, está no cemitério”.
Fim do sonho
Jéssica diz que ser policial era um sonho de infância, mas
que hoje se arrepende de ter ingressado nos quadros da PM. “Eu sonhava em poder
ajudar as pessoas, em ser reconhecida como uma protetora dos inocentes. Mas era
tudo falso. Foi o fim de uma ilusão. Se eu pudesse, de alguma forma, avisar à
Jéssica criança, lá no passado, daria dois tapas na cara dela e diria para ela
acordar, procurar uma outra profissão”, declarou.
SAIBA MAIS: Soldada da PM denuncia coronel por assédio
sexual: “Acabou com a minha vida”
A soldada resolveu denunciar na imprensa os assédios e
ameaças pois ficou com muito medo. “Fiquei com pânico, o que me motivou foi o
medo, eu conheço o sistema até por ser policial, é muito fácil ele mandar fazer
alguma coisa comigo e a Polícia passar pano e [dizer] que por ser policial eu
morri em serviço. Vou jogar isso para frente para as pessoas ficarem sabendo,
como forma de proteção.”
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“Eu não me sinto mais segura, ele pode deixar a poeira
baixar e como qualquer policial que trabalha na rua está sujeito a morrer a
qualquer momento, ele vai me matar, aí vai aparecer na nota da Polícia que eu
estava na rua, troquei tiro com bandido e morri. Minha vida vale mais, hoje
prezo pela minha vida, minha liberdade e ver meus filhos crescerem também, isso
que é importante”, finalizou.
Jéssica contou que o ato de denunciar encorajou outras
vítimas a denunciarem também. Segundo ela, Cássio Novaes já está sendo
investigado por outros dois ou três documentos relacionados à assédio sexual.
Nesta quarta-feira, o advogado de Jéssica solicitou, de
imediato, que a Justiça Militar e o Ministério Público tomem ciência do caso.
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