VAN FINOTTI
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Apoiada em um decreto-lei de 1967, a Caixa Econômica Federal não vai buscar entrar em contato com o vencedor de R$ 162,6 milhões da Mega Sena da Virada. Segundo essa medida da época da ditadura, o prazo de 90 dias extingue-se nesta quarta (31).
Na semana passada, a própria Caixa divulgou que um dos vencedores, de São Paulo, ainda não havia se apresentado e corria o risco de perder o prêmio – o outro, de Aracaju, Sergipe, já retirou seu dinheiro.
Mas o fato de o vencedor “esquecido” ter jogado pela internet chamou a atenção. Afinal, ali ele forneceu seu CPF e outros dados para pagar a aposta.
Desde segunda (29) a Folha vem questionando a Caixa, sem obter resposta, sobre a possibilidade de encontrar o premiado. No mesmo dia, o Procon notificou a instituição pedindo informações sobre a falta de ação.
Nesta quarta (31), o Procon disse que a Caixa respondeu ao questionamento baseando-se em duas leis. A 13.756, de 2018, diz que os prêmios não reclamados serão direcionados ao Fies (Fundo de Financiamento do Ensino Superior). Já o decreto-lei 204, promulgado há 54 anos, estabelece o prazo de 90 dias para a reclamação dos prêmios.
“O que eu questiono é a estratégia da Caixa de querer aplicar esse dispositivo pré-internet, feito em uma época em que o jogador não poderia ser identificado. Estão dizendo que estão proibidos de procurar”, disse Fernando Capez, diretor executivo do Procon-SP.
Na verdade, se as leis citadas pela Caixa não a obrigam necessariamente a entrar em contato com os vencedores, elas tampouco proíbem que a Caixa o faça.
“Essa atitude viola os princípios da transparência e da boa-fé do Código do Consumidor”, afirmou o diretor. “Entendo que o prazo deva ser aplicado para quem tem um jogo não identificado, feito nas lotéricas. Mas, uma vez que a Caixa tem os dados do vencedor em seu sistema, o prazo só deveria passar a valer após o esgotamento das chances de encontrar esse consumidor.”
“Se é possível a identificação do apostador, a Caixa não pode comodamente aguardar o decurso do prazo e se apropriar do dinheiro. Caso o apostador esteja morto, o prêmio pertence aos seus herdeiros. E se a aposta foi feita por meio eletrônico, é dever da instituição financeira informar se não é possível identificar o seu autor”, disse Capez.
Pelo menos desde 2015, os valores não reclamados nas loterias e destinados ao Fies são superiores a R$ 300 milhões por ano – o maior repasse aconteceu em 2018, com R$ 332 milhões.
Esses valores são em geral a somas de milhares de apostas pequenas. Nunca um apostador deixou de reclamar um prêmio próximo a R$ 162 milhões, como está acontecendo agora.
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