Por Karina Rodrigues
A união estável caracteriza-se pela convivência pública, contínua e duradoura entre duas pessoas, do mesmo sexo ou sexos diferentes, com o objetivo de constituir família, formando, assim, uma entidade familiar. O instituto está previsto no art. 1723 do Código Civil e também goza de proteção Constitucional no art. 226 § 3º da Constituição Federal.
Art. 226 (...)
§ 3º Para efeito de proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre homem e mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
Art. 1723 do CC. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituir família.
Em que pese os dispositivos legais se referirem à validade de uniões estáveis somente entre “homem e mulher”, o Supremo Tribunal Federal no bojo da ADI 4277, de relatoria do Ministro Ayres Britto, julgada em 05/05/2011, decidiu pela possibilidade de reconhecimento de união estável entre pessoas do mesmo sexo. Desse modo, a união homoafetiva deve ser reconhecida nos mesmos moldes e com as mesmas consequências da união heteroafetiva.
Muito se tem questionado se há necessidade de os companheiros residirem sobre o mesmo teto para que seja reconhecida a união estável. A resposta é negativa. O STF também já se posicionou nesse sentido, por meio da Súmula 382 que dispensa a existência de coabitação, o que a doutrina convém chamar de more uxório, para a caracterização da união estável.
No entanto, para a efetiva configuração do instituto exige-se o cumprimento de alguns requisitos. O primeiro deles é no sentido de que a união deve ser pública, ou seja, não pode ser uma união às escondidas. Além disso, a união deve ser contínua, ou seja, sem interrupções. Outrossim, como o próprio nome sugere a união deve ser estável, duradoura. Assim, apesar de não se exigir um prazo mínimo, como feito outrora pelo art. 1º da Lei Federal 8971/94 o qual exigia prazo de mínimo de 5 (cinco) anos para a caracterização do instituto, atualmente não há exigência de prazo para a configuração de uma união estável. Consequentemente, a união deve ter como principal objetivo constituir família.
Desse modo, em conjunto com os requisitos supramencionados, as pessoas não podem ter impedimentos para casar. Os impedimentos são aqueles previstos no art. 1521 do Código Civil, ou seja, os impedimentos matrimoniais também impedem a caracterização da união estável.
Como derradeiro requisito, temos que a união entre as pessoas deve ser exclusiva. Nessa linha de raciocínio não é possível o reconhecimento de uniões estáveis simultâneas ou se uma das pessoas envolvidas já seja casada ou não tenha separado de fato.
Vamos agora citar um caso prático para melhor entendimento.
Suponhamos que Pedro é casado com Joana, com quem tem três filhos. Pedro trabalha em dois estados diferentes, assim passa 15 (quinze) dias fora de casa trabalhando. Em uma de suas idas para o outro estado que reside distante de sua família conheceu Maria, por quem apaixonou-se. Logo, passou a conviver em relações paralelas com Maria e Joana, sendo quinze dias com esta, sua esposa, e quinze dias com aquela, que passou a ser conhecida como sua companheira. Dessa maneira, em diversas localidades era conhecido de forma diferente no tocante a sua vida conjugal, sem que a esposa soubesse da companheira e a companheira da esposa. Viveram nesta situação por longos sete anos. Em seguida, Pedro faleceu.
Assim, Maria e Joana, buscaram a proteção previdenciária junto ao INSS, pensão por morte, a primeira na qualidade de esposa e a segunda como companheira de união estável.
Ocorre que Maria não tem direito a pensão por morte. Explico:
Como Pedro já era casado com Joana, a união estável com Maria não pode ser reconhecida. Na verdade, a relação entre Pedro e Maria caracteriza o concubinato.
A vedação ao reconhecimento dessa relação encontra-se no comando legal estampado no § 1º do art. 1723 do Código Civil.
Art. 1723 (...) § 1º A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1521; (...)
Art. 1521. Não podem casar;
(...)
VI – as pessoas casadas;
Lembrando que os impedimentos do casamento, aplicam-se à união estável, como dito outrora. Dentro desse contexto, chegamos a conclusão que a pessoa casada não pode ter, concomitantemente, união estável com outra. Dessa forma, seguindo o exemplo dado, Pedro não pode ter a união estável reconhecida com Maria, porquanto já era casado com Joana.
Nessa mesma linha de argumentação, a pessoa que esteja vivendo em união estável não pode ter reconhecida, simultaneamente, uma outra união estável.
Contudo, como todos os casos devem ser analisados separadamente, vislumbra-se uma exceção no Código Civil, que está prevista no § 1º do art. 1723:
Art. 1723
§ 1º A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa se achar separada de fato ou judicialmente.
Nessa linha de raciocínio, no caso prático exposto, se Pedro tivesse separado de fato ou judicialmente de Joana, não haveria óbice para o reconhecimento de sua união estável com Maria.
Todo este entendimento foi firmado em sede de repercussão geral pelo STF, vindo a firmar a seguinte tese:
A preexistência de casamento ou de união estável de um dos conviventes, ressalvada a exceção do art. 1723 § 1º do Código Civil, impede o reconhecimento de novo vínculo referente ao mesmo período, inclusive para fins previdenciários, em virtude do dever de fidelidade e da monogamia pelo ordenamento jurídico-constitucional brasileiro. STF. Plenário. RE 1045273, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 18/12/2020 (Repercussão Geral – Tema 529).
É importante consignar que o direito brasileiro adota o princípio da monogamia, o qual consagra que uma mesma pessoa não pode contrair e manter concomitantemente dois ou mais vínculos matrimoniais, sob pena de se caracterizar a bigamia.
Por fim, é importante dizer que a bigamia é considerada crime punido com pena de reclusão, previsto no art. 235 do Código Penal.
Art. 235. Contrair alguém, sendo casado, novo casamento:
Pena – reclusão, de dois a seis anos.
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